sábado, 20 de dezembro de 2014

Terras Raras: Aplicações Industriais e Biológicas

Aplicações Industriais e Biológicas

  • As terras raras, para as quais se utiliza o símbolo Ln, correspondem aos elementos do lantânio (La, Z = 57) ao lutécio (Lu, Z = 71), entre os quais se incluem o ítrio (Y, Z = 39) e o escândio (Sc, Z = 21). Mas, segundo recomendações da IUPAC, usam-se os termos lantanídeos para designar os elementos do La ao Lu e terras raras quando aos lantanídeos são incluídos o Sc e o Y.
A expressão terras raras é imprópria para designar estes elementos, que receberam esta denominação porque foram inicialmente conhecidos em forma de seus óxidos, que se assemelham aos materiais conhecidos como terras. 
  • Além da expressão “terras” não ser apropriada à denominação de tais elementos, a expressão “raras” também não está de acordo, pois os lantanídeos são mais abundantes (com exceção do promécio que não ocorre na natureza) do que muitos outros elementos.
Por exemplo, os elementos túlio (0,5 ppm) e lutécio (0,8 ppm) que são as terras raras menos abundantes na crosta terrestre, são mais abundantes que a prata (0,07 ppm) e o bismuto (0,008 ppm)2,3.
  • O primeiro elemento das terras raras descoberto foi o cério, em 1751, pelo mineralogista suíço A. F. Cronstedt, quando obteve um mineral pesado, a cerita. 
Porém, existem controvérsias quanto a este fato e atribui-se o ano de 1787 como o início da história das terras raras, quando Carl Axel Arrhenius encontrou um mineral escuro, a iterbita (também conhecido como gadolinita), em uma pequena vila, Ytterby, próxima a Estocolmo. 
  • Por constituírem uma família que apresenta propriedades físicas e químicas semelhantes, exigindo um trabalho imenso para separá-los com a obtenção de espécies relativamente puras, este grupo de elementos foi pouco explorado durante anos e somente em 1907 é que praticamente todas as terras raras naturais foram conhecidas.
A industrialização das terras raras teve início com a fabricação de camisas de lampiões. Com o passar do tempo suas propriedades foram tornando-se mais conhecidas e seus compostos passaram a ser mais utilizados, tais como na produção de “mischmetal” para pedras de isqueiro, baterias recarregáveis e aplicações metalúrgicas.
  • Com o desenvolvimento tecnológico as terras raras passaram a ganhar novos usos e, hoje em dia, o universo de suas aplicações é muito abrangente, sendo utilizadas como catalisadores, por exemplo, no tratamento de emissões automotivas e no craqueamento do petróleo; na fabricação de laseres e como materiais luminescentes, “fósforos” na fabricação de lâmpadas fluorescentes e tubos de raios catódicos de aparelhos de televisão, etc.
O interesse em aplicar as terras raras na investigação das propriedades e funções de sistemas bioquímicos e na determinação de substâncias biologicamente ativas tem aumentado. 
  • As terras raras são usadas principalmente como sondas espectroscópicas no estudo de biomoléculas e suas funções, por exemplo em traçadores biológicos para acompanhar o caminho percorrido pelos medicamentos no homem e em animais; como marcadores em imunologia (fluoroimunoensaios) e também, como agentes de contraste em diagnóstico não invasivo de patologias em tecidos por imagem de RMN (ressonância magnética nuclear).
As terras raras têm as mais diversificadas aplicações e não é objetivo deste trabalho fazer uma revisão completa, pois seria impraticável, mas sim mostrar algumas aplicações já estabelecidas para estes elementos e suas potencialidades.

Propriedades:
  • As inúmeras aplicações das terras raras são devidas às suas propriedades ímpares, principalmente as espectroscópicas e magnéticas. As propriedades químicas e físicas dos elementos lantanídeos são muito semelhantes; isto é uma conseqüência da sua configuração eletrônica. 
Todos os átomos neutros possuem em comum a configuração eletrônica 6s2 e uma ocupação variável do nível 4f (com exceção do lantânio, que não possui nenhum elétron f no seu estado fundamental) por ser energeticamente mais favorável. Porém, para os íons trivalentes este efeito desaparece e é observado um aumento regular na configuração 4fn (n = 1 - 14). 
  • A configuração eletrônica desses elementos pode ser resumida em: [Xe] 4fn 5s2 5p6 CD-1 6s2 e através desta, pode-se observar que os orbitais 4f estão protegidos do ambiente químico pelos orbitais 5s, 5p e ainda 5d 6s3.
Dos estados de oxidação, o trivalente é o mais comum e característico da grande maioria dos compostos de terras raras, sendo ainda o mais estável termodinamicamente. Este estado de oxidação (+III) não depende apenas da configuração eletrônica, mas também de um balanço entre as energias de ionização, reticular, de ligação e de solvatação para o caso de soluções. 
  • O estado de oxidação (+II), embora notado para todos os elementos nos haletos binários, é pouco comum em solução e em complexos, devido à fácil oxidação para o estado de oxidação (+III). O único lantanídeo no estado de oxidação (+IV) que é suficientemente estável em solução aquosa é o íon Ce4+, podendo ser encontrado neste estado tetravalente em alguns compostos com alto poder oxidante. 
Itérbio, praseodímio e neodímio também são encontrados no estado tetravalente, mas são todos instáveis em solução, podendo ser obtidos somente como sólidos, na forma de fluoretos, ou de óxidos (podem ser não estequiométricos). Como já mencionado, os lantanídeos caracterizam-se pela química dos elementos no estado de oxidação (+III). 
  • Nos compostos com esses íons trivalentes os orbitais 4f estão localizados na parte interna do átomo e são totalmente protegidos pelos elétrons dos orbitais 5s e 5p, têm extensão radial limitada e não participam das ligações, ocorrendo somente um envolvimento muito pequeno com os orbitais dos ligantes. Devido a isso os íons lantanídeos formam complexos com alto caráter iônico.
Uma importante característica dos elementos lantanídeos é a ocorrência da contração lantanídica, uma diminuição uniforme no tamanho atômico e iônico com o aumento do número atômico. 
  • A principal causa da contração é o efeito eletrostático associado com o aumento da carga nuclear blindada imperfeitamente pelos elétrons 4f. Assim, é observada uma mudança na química dos íons lantanídeos. 
Por exemplo, como conseqüência dessa contração, a basicidade dos elementos decresce ao longo da série e esta diferença de basicidade é responsável pela separação dos mesmos por métodos de fracionamento e pelas pequenas variações nas propriedades desses elementos ao longo da série.
  • Com relação ao arranjo espacial, os íons Ln3+ são bastante diferentes dos outros íons metálicos trivalentes. Como os íons Ln3+ são maiores, há um aumento do número de coordenação, que pode variar de 6 a 12 tanto no estado sólido quanto em solução, sendo os números de coordenação 8 e 9 os mais comuns.
Os lantanídeos são classificados de acordo com os conceitos de Pearson como ácidos duros; por isso, coordenam-se preferencialmente com bases duras, especialmente àquelas contendo oxigênio, nitrogênio e enxofre como átomos doadores.
Os íons Ln3+ são paramagnéticos com exceção dos íons Y3+, La3+e Lu3+, que são diamagnéticos. 
  • Nos compostos com esses íons trivalentes a luminescência em geral, é devida às transições f-f. Como os elétrons 4f são internos só existem efeitos muito fracos do campo dos ligantes. Em conseqüência, as propriedades eletrônicas são pouco afetadas pelo ambiente químico e as transições ópticas são geralmente muito finas. Essas transições f – f são proibidas (regra de Laporte), por isso suas transições ópticas são geralmente caracterizadas por tempos de vida longos, de microsegundos a milisegundos.
Transições ópticas 4f – 5d também são possíveis e originam bandas muito mais intensas que as transições tipo f – f, mas essas bandas são geralmente muito largas. A luminescência do Eu2+ (4f7) e Ce3+ (4f1) são exemplos deste tipo de transição.
  • A luminescência por excitação direta do íon lantanídeo é pouco eficiente, porque os íons lantanídeos não têm absortividades molares altas; então, usa-se um ligante que absorve luz e este transfere energia para o íon lantanídeo, que emite sua luminescência. Deste modo, ocorre uma transferência de energia intramolecular do ligante ao íon metálico central. 
Na linguagem dos espectroscopistas este efeito é conhecido como “efeito antena”. A eficiência da transferência de energia do ligante para o íon lantanídeo depende da natureza química do ligante coordenado ao íon lantanídeo.

Aplicações Industriais:
  • As primeiras aplicações das terras raras foram 100 anos após a descoberta das primeiras terras raras (Y e Ce), aproximadamente em 1800. 
A história industrial desses elementos iniciou-se com o desenvolvimento por Carl Auer von Welsbach de um dispositivo de muito sucesso na época, que melhorou a iluminação artificial: as camisas de lampiões a gás. Welsbach, sabendo que muitos óxidos brilham fortemente sob aquecimento, tentou encontrar alguns óxidos adequados os quais incandesceriam em contato com a chama. Após examinar várias misturas de óxidos verificou que o melhor resultado era dado pela mistura de 99% de óxido de tório e 1% de óxido de cério. Suas idéias e técnicas foram patenteadas em 18915.
  • Com a fabricação das camisas de lampiões a gás surgiu uma nova indústria química de recuperação do tório da monazita e com a recuperação do tório originou-se um subproduto de material de terras raras: o “mischmetal”, com composição típica La ~ 25%, Ce ~ 50%, Pr ~ 6%, Nd ~ 15%, Fe ~ 3 e 1% de impurezas como Si e Pb. “Mischmetal” é uma liga obtida fazendo-se a eletrólise do cloreto da mistura de terras raras a ≈ 850 ºC. Seu ponto de fusão não é muito definido, mas é na faixa de 800 ºC. É um redutor forte comparável ao magnésio, reage com água quente e também forma oxissulfetos quando exposto ao ar.
Com o “mischmetal” aumentaram as aplicações das terras raras na indústria e até início do século XX a utilização das terras raras era quase que somente como matéria-prima para a produção de “mischmetal”.
  • A primeira aplicação do “mischmetal” foi na produção de pedras para isqueiro, patenteada em 1903; a composição da liga é de ≈ 65% “mischmetal” e ≈ 35% de ferro. 
Devido à alta quantidade de cério pirofórico, este material metálico queima rapidamente numa forma finamente dividida quando é raspado; fragmentos removidos da superfície serão suficientemente aquecidos para incendiar o gás inflamável. Este princípio foi usado mais tarde para os isqueiros de charutos e, atualmente, para os isqueiros a gás mais modernos. Uma das maiores aplicações do “mischmetal” é em metalurgia.
  • Por exemplo, quando adicionado a ligas de magnésio estas passam a ter propriedades mecânicas muito melhores, tais como alto poder de tensão e boa resistência a altas pressões. Ligas deste tipo são utilizadas em componentes aeronáuticos, em motores de aviões a jato e em componentes de cápsulas espaciais e satélites, operando a temperaturas superiores a 200 ºC. Pequenas quantidades de “mischmetal” adicionadas ao ferro fundido acarretam melhora na qualidade da liga.
Com isso, este ferro passa a ter melhor resistência ao choque, maior força e ductilidade. O ferro fundido obtido nestas condições é usado na fabricação de tubos de pressão e componentes automobilísticos.
  • No entanto, o maior uso do “mischmetal” é como aditivo para tratamento do aço. Sua adição ao aço elimina impurezas de enxofre e oxigênio por causa da alta afinidade dos lantanídeos por esses elementos. O maior uso deste aço é na fabricação de chapas e em encanamentos para gases e óleos.
O “mischmetal” também é usado na fabricação de baterias recarregáveis do tipo níquel-hidreto metálico (que apresentam alta capacidade e tempo de vida longo) e em síntese orgânica (reações tipo Barbier, Grignard e Reformatsky).

Catálise:
  • Até os anos 80, uma das maiores aplicações das terras raras era em catálise, onde são usadas geralmente na forma de óxidos. Estes têm sido extensivamente investigados como co-catalisadores em aplicações comerciais, pois sua adição ao material catalítico melhora a atividade, seletividade e aumenta a estabilidade térmica do mesmo.
Por exemplo, as terras raras são usadas no tratamento de emissões gasosas, rejeitos líquidos e, principalmente, no tratamento de emissões automotivas e em processos de craqueamento de frações do petróleo (estabilização de zeólitas).

Catalisadores Automotivos:
  • No tratamento de emissões automotivas, o óxido de cério (também conhecido como céria, que é um sólido não estequiométrico de duas fases, composto de óxido de Ce3+ e Ce4+) é o mais utilizado devido às suas propriedades de oxi-redução, alta mobilidade de oxigênio e também por ser um estabilizador.
Catalisadores para tratamento de emissões automotivas são conhecidos como catalisadores do tipo três vias (“three way”); estes são usados atualmente na maioria dos carros para diminuir o nível de emissões poluentes (CO, NOx e hidrocarbonetos). 
  • Seu funcionamento nos escapamentos dos automóveis é o seguinte: o catalisador é montado dentro de uma carcaça de aço inoxidável, dando origem ao “conversor catalítico”. Este é constituído por um suporte de cerâmica (corderita) na forma de colmeia. 
Neste suporte é depositado o material catalítico composto por alumina de alta área específica, sobre a qual são adicionados os elementos ativos platina, paládio, ródio, o promotor óxido de cério e os estabilizadores estruturais níquel, zircônio, bário e o óxido de lantânio. As principais reações que ocorrem são as reações de oxidação do CO e hidrocarbonetos e redução do NO:
CeO2 + xCO → CeO2-x + xCO2
CeO2 + CxHy → CeO2-(2x +0,5y) + xCO2 + 0,5yH2O
CeO2-x + xNO → CeO2 + 0,5xN2
Essas reações são realizadas de forma simultânea e é necessário manter a relação entre os poluentes e o oxigênio próxima ao ponto estequiométrico. 
  • Então, a céria também tem a função de fornecer oxigênio de sua própria rede cristalina quando a mistura está com falta de oxigênio, quando está com excesso oxigênio esta é reoxidada. 
Além dessas funções, a adição da céria evita que os catalisadores percam a eficiência em altas temperaturas, pois ela inibe as transições de fase da alumina.
CeO2 → CeO2-x + 0,5xO2
CeO2-x + 0,5xO2 → CeO2
Craqueamento de frações do petróleo (estabilização de zeólitas) Zeólita é um aluminossilicato cristalino com estrutura tridimensional formada pela associação de tetraedros de silício (SiO4) e alumínio (AlO4), ligados uns aos outros pelos átomos de oxigênio. 
  • As zeólitas são consideradas como os catalisadores mais importantes na indústria petroquímica. Além de serem sólidos porosos, apresentam sistemas de canais e cavidades específicas e área superficial elevada. As estabilidades química e térmica em zeólitas são conseguidas pelas diferentes condições de troca iônica e pré-tratamento (calcinação e ativação). 
Estas condições podem ser controladas visando a obtenção de catalisadores ativos e seletivos para reações que necessitam de acidez elevada para se processarem (por exemplo, isomerização, alquilação e craqueamento de hidrocarbonetos alifáticos e aromáticos). 
  • As terras raras na forma de óxidos ou cloretos são adicionadas a zeólitas para melhorar sua estabilidade térmica e hidrotérmica. Os íons Ln3+ atuam como contra-íons, compensando a carga eletrônica e proporcionando estabilidade estrutural à zeólita. 
Além disso, incrementam a acidez no sistema, através da dissociação protônica das moléculas de água coordenadas ao íon no interior das cavidades zeolíticas, evitando assim a desaluminação da zeólita e, conseqüentemente, aumentando a atividade catalítica. Zeólitas Y contendo terras são conhecidas como componentes de catalisadores FCC (“fluid catalytic cracking”) para o craqueamento de frações do petróleo.
  • As propriedades catalíticas das terras raras são também utilizadas em diversas reações, tais como hidrólise de ésteres fosfóricos, alquilação e alcilação de Friedel-Crafts, reações tipo Reformatsky, Diels-Alder, Barbier e Grignard, entre outras. 
Porém, a aplicação de organolantanídeos como catalisadores na polimerização de olefinas é uma das aplicações mais recentes das terras raras como catalisadores.

Indústria de vidro:
  • Na indústria de vidro as terras raras são também muito utilizadas e o cério é um dos elementos mais empregados. O primeiro estudo de cério em vidro foi feito por Schott em 1880; este é usado na forma de óxido nos materiais de polimento de vidro e também na descoloração do mesmo. 
Como todos os vidros, com exceção daqueles de alta qualidade óptica, contém ferro e este absorve luz dando uma coloração verde intensa ao vidro, então, adiciona-se óxido de cério com a finalidade de oxidar Fe(II) a Fe(III); assim, o vidro que inicialmente tinha coloração verde passa a ter uma coloração amarela azulada. 
  • Para neutralizar este tom resultante utiliza-se um corante de cor complementar como, por exemplo, o óxido de neodímio. Na coloração de vidro, a mistura Ce/Ti é utilizada para dar a coloração amarela, Nd/Se ou Er para coloração rósea, Nd a coloração azul-violeta e Pr a cor verde.
Devido ao fato de o íon cério absorver fortemente na região do ultravioleta, é também utilizado na fabricação de lentes oftálmicas especiais para uso solar e na fabricação de recipientes de vidro que absorvem a radiação ultravioleta para serem usados, por exemplo, para armazenar alimentos que são afetados pela luz. Uma mistura Eu/Ce é utilizada na fabricação de óculos escuros.
  • Em vidros de alta qualidade óptica, adiciona-se óxido de lantânio de alta pureza. Vidros deste tipo são usados na fabricação de lentes de precisão. Devido ao seu elevado índice de refração, as lentes feitas com este material possuem espessura menor que lentes equivalentes feitas com vidro óptico comum. Os vidros contendo neodímio e praseodímio, de alta pureza, têm aplicação como filtros especiais para calibração de instrumentos ópticos, pois esses íons possuem bandas de absorção estreitas. 
A mistura de óxido de neodímio e praseodímio é usada na fabricação de óculos de proteção para uso em trabalhos de fusão e soldagem, devido à capacidade destes elementos absorverem a luz amarela do sódio. 
  • Óxido de neodímio é incorporado em vidro para telas de TV, com a finalidade de usar sua propriedade de absorver luz perto de 580 nm, no pico de sensibilidade do olho humano, para bloquear a luz amarela incômoda do ambiente, que incide de frente no tubo da TV refletindo de volta.
Ímãs Permanentes:
  • Esta é uma das aplicações das terras raras que vem crescendo bastante nos últimos anos e isto pode ser verificado pelo número de patentes de novas formulações. Os ímãs permanentes comerciais mais comuns são SmCo5 e Nd2Fe14B, sendo o último destes o ímã permanente com maior campo magnético específico que se conhece. 
Esses ímãs são utilizados em motores, relógios, tubos de microondas, transporte e memória de computadores, sensores, geradores, microfones, raios X, imagem de ressonância magnética (IRM), separação magnética, etc.

Imãs Permanentes

Materiais luminescentes (“fósforos”):
  • Materiais luminescentes são chamados de fósforos. Esses materiais são constituídos por uma rede cristalina (hospedeira) e um centro luminescente, que é o ativador. O Y2O3:Eu3+ é um exemplo de material luminescente, onde o Y2O3 é a rede cristalina e o íon Eu3+ o ativador. A radiação eletromagnética emitida por esses materiais luminescentes ocorre geralmente na região do visível. 
Um dos mecanismos de luminescência: o ativador (A) absorve radiação e o elétron passa para o estado excitado (A*); este retorna ao estado fundamental por processos radiativos (R) (luminescência) ou pode decair por processos não radiativos (NR) (cedendo calor à rede). 
  • No entanto, para muitos materiais luminescentes a situação é mais complicada que o descrito neste mecanismo, porque a radiação não é absorvida pelo ativador devido à pobre absorção dos íons lantanídeos, como mencionado anteriormente. Então, adiciona-se outra espécie à matriz hospedeira e este pode absorver energia e subsequentemente, transferi-la para o ativador (A) o qual luminesce.
A espécie que absorve energia é chamada de sensibilizador (S). Quando a desativação de uma espécie ocorre através da ativação de outra, o processo é denominado transferência de energia intermolecular. A transferência de energia do sensibilizador (S) para o ativador (A) só é possível se um dos níveis de energia do ativador for menor ou igual ao nível luminescente do sensibilizador, ou seja, que haja condição de ressonância.
  • As características mais importantes dos fósforos são tempo de vida longo da luminescência, eficiência luminosa, reatividade, estabilidade e morfologia do pó, ou seja, quanto mais homogêneo melhor será o desempenho do fósforo. Existe uma quantidade muito grande de fósforos de terras raras e uma preocupação contínua na pesquisa de fósforos é aumentar a eficiência destes materiais.
Os principais fósforos usados na indústria são Y2O3:Eu3+, Y2O2S:Eu3+, YVO4:Eu3+, Y2(WO4)3:Eu3+ (cor vermelha); Sr5(PO4)3Cl:Eu2+, BaMgAl11O17:Eu2+, Sr2Al6O11:Eu2+ (cor azul); CeMgAl11O19:Tb3+, (Ce, Gd)MgB5O10:Tb3+, (LaCe)PO4:Tb3+, YSiO5:Tb3+, Y3Al5O12:Tb3+ (cor verde).
  • As aplicações dos fósforos de terras raras são inúmeras e uma dessas aplicações é em tubos de televisores coloridos, onde são usados para produzir as três cores primárias: vermelha, azul e verde. 
As transições responsáveis por essas cores são 5D0 → 7FJ (J=2) do íon Eu3+, emissão em 611 nm (vermelha); 5D0 → 7FJ (J=2) do íon Tb3+, emissão em 550 nm (verde) e a transição 5d → 4f do íon Eu2+, emissão em 450 nm (azul). 
  • Esses materiais, além de serem usados em aparelhos de televisão, são usados também em fibras ópticas, lâmpadas fluorescentes, LEDs, tintas, vernizes, marcadores ópticos luminescentes, telas de computadores, detecção de radiação (raios-γ e elétrons), etc. 
Como podemos observar, as aplicações baseadas na luminescência das terras raras têm alcançado uma posição importante na sociedade moderna.

Laser:
Uma outra aplicação das terras raras é na fabricação de laseres.
  • Os materiais a serem utilizados como meio laser ativo, para a obtenção de alta potência, devem possuir linhas de emissão (luminescência) estreitas, bandas de absorção intensas e tempos de decaimento do estado metaestável longos para armazenamento de energia. Algumas matrizes sólidas apresentam estas características quando são incorporadas pequenas quantidades de impurezas. 
As terras raras apresentam naturalmente estas características pois possuem transições intra-configuracionais proibidas por dipolo elétrico e, portanto, com tempos de decaimentos longos, além de os elétrons estarem relativamente blindados com relação ao campo cristalino sendo, então, pouco sensíveis ao hospedeiro.
  • Os íons terras raras constituem o meio ativo que é responsável pela luz laser. Esses íons são introduzidos em cristais mistos de fluoretos ou óxidos, que são as matrizes hospedeiras. 
Essas matrizes devem ter boas propriedades ópticas, mecânicas e térmicas para resistirem às condições severas de operação laser, e o íon incorporado, por sua vez, além das propriedades ópticas, deve ter tamanho comparável e valência igual ao íon que irá substituir na matriz, para evitar deformações da rede e compensação de carga, respectivamente.
  • Além disso, o sítio a ser ocupado pelo íon Ln3+ não deve apresentar simetria de inversão. No laser a emissão é estimulada para desencadear uma avalanche de fótons coerentes, isto é, todos com a mesma freqüência, fase, polarização e mesma direção de propagação.
Os íons terras raras mais utilizados como meio ativo são Er3+,Nd3+ e Ho3+. Os íons Pr3+ e Tm3+ também são utilizados. Cada tipo de meio ativo resulta em luz laser de comprimento de onda específico.
  • Já os cristais dopados de terra raras mais usados atualmente como laseres são Nd:YAG (granada de ítrio e alumínio, Y3Al5O12), Er:YAG, Ho:YAG, Er:YSGG (granada de ítrio-escândio-gálio), Nd:YLF (fluoreto de litio-ítrio), Ho:YLF, Nd:Vidro (borossilicatos), Nd:YVO4 (vanadato de ítrio). 
O que difere nestes cristais, além do comprimento de onda de emissão da luz laser, é a estabilidade térmica, qualidade óptica, tempo de vida da luminescência e eficiência. Por exemplo, o tempo de vida de emissão do NdYVO4 é de 90 ms e do Nd:YAG, 550 ms,
  • O mecanismo da emissão laser do Nd:YAG: o íon Nd3+ é excitado por uma radiação policromática (lâmpada flash, por exemplo) para um nível muito largo em energia e vida curta (nível chamado de N4). Toda a população de elétrons que se encontra no nível N4 decai para o nível N3 (4F3/2), que é metaestável (conveniente para ser usado na ação laser). 
Desse nível N3 ocorre a transição estimulada para o nível N2 (4I11/2) que é a radiação laser (coerente e monocromática). Para que haja um grande ganho de energia e conseqüentemente maior potência do laser, é necessário manter a população de N3 maior que a de N2. 
  • Por isso, é importante que haja um decaimento rápido do nível N2 para o nível N1, mantendo a inversão de populações, 4F3/2 vs 4I11/2, ou seja, preencher o nível N3 e esvaziar o nível N2 rapidamente. O laser de Nd:YAG, por exemplo, tem uma potência muita alta, porque a população de elétrons do nível N3 é muito grande e do nível N2 muito pequena. Por isso o ganho de energia é muito grande.
Esses laseres de terras raras são muito utilizados e algumas de suas aplicações são em espectroscopia (fonte de luz), corte de semicondutores, micro-soldas, perfuração de áreas diminutas para a passagem de fios finíssimos, odontologia e medicina. 
  • Na medicina, por exemplo, são usados na oftalmologia, onde se usa laseres para tratamento de deslocamento de retina, corrigir miopia e outros usos cirúrgicos e na dermatologia, para esfoliamento de pele.
Biológicas:
  • Em sistemas biológicos os elementos terras raras têm sido extensivamente estudados, devido às suas propriedades excepcionais, principalmente, as espectroscópicas e magnéticas. 
Esses elementos são geralmente usados como sondas espectroscópicas no estudo de biomoléculas e suas funções, especialmente proteínas que se ligam ao cálcio. Eles são usados também como agentes de contraste em RMN, devido às suas propriedades magnéticas.
  • Nos sistemas biológicos os íons lantanídeos, todavia, interagem com materiais biológicos em caminhos específicos, substituindo os íons cálcio, bem como outros íons, tais como Zn(II), Mg(II), Fe(II) e Fe(III), fornecendo informações sobre esses materiais e os processos químicos ocorridos com biomoléculas que contém estes elementos.
Estudos sobre a interação de lantanídeos com sistemas biológicos adquirem particular importância em vista da similaridade nos tamanhos dos íons Ca(II) e Ln(III), natureza de ligação na formação de sistemas biológicos, geometrias de coordenação e preferências por grupos contendo oxigênio, nitrogênio e enxofre como átomos doadores na formação de complexos. 
  • Além disso, os raios dos íons lantanídeos são similares aos dos íons cálcio, observando-se que nos íons Ln(III) o raio varia entre 106 pm (La) e 85 pm (Lu), enquanto que o raio do íon cálcio é de 100 pm (considerando-se o número de coordenação).
Ambos os íons, Ca(II) e Ln(III), são caracterizados por uma coordenação flexível e suas ligações são principalmente de natureza eletrostática. Diferenças significativas entre o cálcio e os lantanídeos são reveladas em suas propriedades espectroscópicas e magnéticas. 
  • O íon cálcio é incolor, diamagnético e não apresenta luminescência, enquanto que certos elementos da série dos lantanídeos são coloridos, paramagnéticos e emitem radiação característica. Além disso, as propriedades físicas e químicas dos lantanídeos fazem com que eles sejam úteis em estudos de sistemas bioquímicos e isto é uma conseqüência de suas estruturas eletrônicas. 
Também, a carga positiva extra dos íons lantanídeos, comparadas com a do íon Ca(II), na maioria dos casos, contribui para maior estabilidade dos complexos formados com proteínas. Em vista disso, os íons de terras raras inibem a maioria das enzimas cálcio dependentes.
  • Dentre os lantanídeos, os íons Eu(III) e Tb(III), são os mais utilizados como sondas espectroscópicas, nas quais os quelatos destes elementos, tais como criptatos e β-dicetonatos, são os mais convenientes como sondas luminescentes para sistemas biológicos. 
Isto se deve ao fato de os mesmos serem muito estáveis e a transferência de energia do quelato para o íon Ln ser muito eficiente (~ 100%), fazendo com que a luminescência seja muito intensa também, apresentando assim, alto rendimento quântico. 
  • Os tempos de vida destes complexos são longos (100 a 1000 μs); suas transições ópticas são bastante finas; a diferença de energia entre a absorção do ligante e a emissão do íon (deslocamento Stokes) é muito grande, acima de 250 nm; possuem alta sensibilidade de detecção (10-14 mol L-1); têm boa biocompatibilidade e facilidade de se ligarem ao reagente bioanalítico usado como, por exemplo, o anticorpo.
Imunologia (fluoroimunoensaios):
  • Devido a todos os fatores já mencionados, os complexos de terras raras são utilizados em imunologia para diagnóstico clínico. Esse método baseado no uso de marcadores luminescentes é chamado de fluoroimunoensaio e é utilizado na investigação de enzimas, anticorpos, células e hormônios, entre outros.
As vantagens em utilizar os íons lantanídeos como marcadores luminescentes são várias, pois é um método seguro, de baixo custo e apresenta maior especificidade. 
  • Os ensaios são mais sensíveis que radio inumo ensaios e a luminescência pode ser medida rapidamente, com alto grau de sensibilidade e exatidão.
O princípio desse método de imunologia (fluoroimunoensaio) é o seguinte:
  • Na primeira etapa os íons lantanídeos na forma de complexos, por exemplo, o isotiocianatofenil-EDTA-Eu, ligam-se ao anticorpo (anticorpos são proteínas pertencentes à classe das globulinas, geradas pelo sistema imune para reconhecer substâncias estranhas, denominadas antígenos, que podem ser uma proteína ou outra macromolécula) através de uma ligação covalente entre o grupo tiocianato e o grupo amino livre da proteína (usa-se por exemplo, o isotiocianatofenil-EDTA, porque para usar o íon Eu(III) como marcador ele tem que estar ligado fortemente ao componente imunoreativo) e
  • Depois da reação de imunologia, a proteína marcada é separada do excesso de reagente por filtração em gel e tratada, em um pH baixo (pH 3), por outro agente quelante, por exemplo, β-dicetona.
O pH baixo desta solução faz com que o íon európio se dissocie do complexo primário, formando um novo complexo com esse segundo quelato (β-dicetona), sendo que este segundo complexo é fortemente luminescente.
  • Esses métodos imunológicos geralmente são executados na presença de água; por isso, o processo deverá ser otimizado com respeito à baixa solubilidade das β-dicetonas em água e à diminuição da luminescência pela presença de moléculas do solvente. 
Portanto, para solubilizar as β-dicetonas usa-se um detergente não-iônico (Triton X-100), o qual dissolve a molécula orgânica na fase micelar e elimina as moléculas de água do quelato de európio. Para isolar o quelato do solvente adiciona-se óxido de trioctilfosfina, pois o mesmo ligase fortemente ao íon európio. 
  • Neste novo composto o íon európio está protegido em forma de gaiola por várias moléculas, apresentando alta luminescência e, então, a medida poderá ser feita (detecção).
Medicina: 
Diagnóstico não invasivo (agentes de contraste):
  • Na medicina uma aplicação já estabelecida dos íons terras raras é como agente de contraste em diagnóstico não invasivo de patologias em tecidos, por imagem de ressonância magnética nuclear (RMN).
Os agentes de contraste são substâncias paramagnéticas que alteram os tempos de relaxação dos prótons da água dos tecidos onde se localizam e podem ser detectados com facilidade. 
  • Ou seja, uma substância paramagnética administrada ao corpo altera a intensidade de imagem de RMN indiretamente, encurtando os tempos de relaxação T1 e/ou T2 da água dos tecidos.
Muitos compostos de terras raras são investigados para esse fim e muitos pesquisadores estão focalizando suas pesquisas em agentes de contraste mais eficientes e seletivos. Dentre os lantanídeos, atualmente, o íon gadolínio é o único elemento utilizado clinicamente como agente de contraste. 
No entanto, outros íons lantanídeos estão sendo investigados para esse fim.
  • O íon Gd3+ é utilizado devido ao fato de ser paramagnético e possuir um momento magnético muito alto; esse é um fator muito importante no efeito de relaxação, pois os íons com maior momento magnético são os mais eficientes nos seus efeitos de relaxação protônica. 
Além disso, o gadolínio só tem um estado de oxidação disponível em potenciais acessíveis biologicamente, o que é uma vantagem, assumindo-se que o metabolismo pela oxidação ou redução tem tendência para produzir baixa tolerância in vivo. 
  • Esse íon na forma livre é muito tóxico (baixa tolerância) e se ingerido dessa forma é retido no fígado, porque o tempo de meia vida do gadolínio livre é muito diferente de seus complexos; enquanto o tempo de meia vida de um determinado complexo de gadolínio é aproximadamente 10 min, o tempo de meia vida do íon livre é maior que sete dias. 
Por isso, esse íon precisa estar incorporado a moléculas transportadoras, tais como macromoléculas biológicas e quelatos, pois esses são eliminados rapidamente pela urina. Portanto, as características mais importantes desses compostos são alta estabilidade, baixa osmolalidade e alta tolerância. Com quelatos, o íon gadolínio forma três grupos diferentes de compostos 
  1. Iônicos e hidrofílicos; 
  2. Não-iônicos e hidrofílicos e
  3. Iônicos e lipofílicos. Por exemplo, o ácido dietilenotriaminapentaacético (DTPA) e ácido 1,4,7,10-tretraazaciclododecano-N,N’,N”,N”’-tetraacético formam com o íon Gd3+ os compostos [GdDTPA(H2O)]2- e [GdDOTA(H2O)]-, respectivamente, que pertencem ao primeiro grupo. 
Derivados desses ácidos formam os compostos (Gd-DTPA-BMA) e (Gd-HP-DO3A), que pertencem ao segundo grupo e o composto (Gd-EOB-DTPA) que pertence ao terceiro grupo. Salienta-se que somente os quatros primeiros compostos já são usados clinicamente.

Outras Considerações:
  • Neste trabalho procurou-se mostrar as propriedades das terras raras e algumas de suas aplicações já estabelecidas. Além das aplicações relatadas, muitas outras não mencionadas são de grande relevância. 
A química das terras raras está cada vez mais importante nos dias atuais e uma prova disso é que o número de publicações acadêmicas vem crescendo a cada ano nesta área, bem como as aplicações. Como podemos verificar no que foi exposto, através do exame das propriedades das terras raras, bem como as múltiplas e importantes aplicações desses elementos, verifica-se o enorme potencial dos mesmos.
  • Na indústria, as aplicações dos compostos de terras raras são bastante amplas e, além das inúmeras aplicações já estabelecidas para os mesmos, muitas outras em estudos são promissoras, principalmente as aplicações que exploram as propriedades luminescentes dos íons de terras raras.
Nos sistemas biológicos os íons de terras raras são considerados amplamente importantes; além da sua grande relevância como marcadores em imunologia, são bastante importantes na detecção de funções celulares in vivo para elucidação estrutural e função de enzimas e proteínas. Nestes sistemas biológicos as terras raras vêm se destacando bastante nos últimos anos. 
  • Isso pode ser verificado pelo fato de inúmeros grupos de pesquisadores no mundo todo desenvolverem estudos sobre esses elementos. Esses estudos baseiam-se principalmente nas propriedades luminescentes e magnéticas dos íons de terras raras. O estudo de novas aplicações biomédicas dos íons terras raras tem sido o enfoque de muitos pesquisadores nos últimos anos. 
Além dos agentes de contrastes que já são utilizados, novos agentes de contrastes mais seletivos estão sendo pesquisados e os resultados têm sido muito promissores. Estão sendo pesquisados também lantanídeos radioativos para aplicação médica nuclear, por exemplo, no tratamento do câncer.
  • A combinação de diversas inovações na ciência dos materiais, ciências biológicas, sínteses inorgânica e bioinorgânica, química do estado sólido, métodos preparativos em escala industrial e caracterização analítica são as chaves para o desenvolvimento de novas aplicações dos elementos terras raras em diversas áreas.

Biomarcadores Luminescentes