segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Elegibilidade dos projetos MDL

Mercado de Carbono

  • Para todos os projetos MDL, o país onde o projeto está localizado deve ratificar o Protocolo de Quioto e designar uma Autoridade Nacional para avaliar se os projetos propostos contribuem para o desenvolvimento sustentável.
Na Sétima Conferência das Partes (COP 7) de CQNUMC, em Marraqueche em 2001, foi acordado que o florestamento (estabelecimento de novas florestas) e reflorestamento (restabelecimento de florestas anteriores) são atividades elegíveis pelo MDL. Contornar ou evitar o desmatamento ainda não constituem atividades elegíveis.

Propostas de países em desenvolvimento: 
De incentivos positivos para evitar o desmatamento.
  • O desmatamento nos trópicos é levado a cabo por agricultores familiares de subsistência na África, por grandes empresas agrícolas produtoras de carne e soja para exportação e por madeireiras na América do Sul, e por uma mistura de ambos na Ásia, com óleo de palmeira, café e madeira como os principais produtos. Isso resulta na liberação de dióxido de carbono na atmosfera e contribui para emissões de GEE. 
Preservar a floresta tropical é uma forma de redução das emissões altamente custo-eficiente e tem o potencial de oferecer reduções significativas rapidamente. Trás consigo, também, muitos outros benefícios, como a conservação da biodiversidade e a proteção da qualidade do solo e da água. Entretanto, não há nenhum incentivo explícito através do MDL, para que os países tropicais evitem o desmatamento, principalmente por causa da preocupação do risco de que a proteção de florestas, em uma área de projeto, levará ao desmatamento em uma outra.
  • Em 2005, na COP 11 em Montreal, Papua Nova Guinea e Costa Rica em favor da Coalizão das Nações de Floresta Tropical, propuseram um mecanismo que permita que o dióxido de carbono economizado através da redução do desmatamento em países em desenvolvimento seja comercializado internacionalmente. Cada nação com floresta tropical úmida estabeleceria uma linha de base nacional de desmatamento e negociaria um comprometimento voluntário para reduzir o desmatamento abaixo dessa linha de base. As reduções conseguidas poderiam então ser comercializadas através do MDL de Quioto ou em outros mercados de carbono.
Em 2006, na COP 12 em Nairobi, o Brasil propôs um mecanismo de incentivos positivos para ações voluntárias de países em desenvolvimento para evitar o desmatamento fora do MDL. Um índice de emissões de referência de um certo período no passado seria estabelecido e se o índice de desmatamento está abaixo dessa referência o país em desenvolvimento participante estará no direito a benefícios financeiros, calculados pela conversão da diferença entre a referência e os índices reais em valores econômicos. Ambas propostas estão na mesa para serem discutidas em 2007.
Na COP 9, em Milão, foram acordadas definições básicas para sistemas florestais,
  • deixando, a cada país, uma margem de escolha de faixas e/ou limites que definem esses sistemas. Por exemplo, o Brasil escolheu as margens superiores, onde as florestas devem ter um mínimo de 30% de cobertura de copa, com árvores tendo uma altura mínima de cinco metros na maturidade. Áreas com valores abaixo desses parâmetros em 1990 (o ano-base), em que se possa demonstrar que, no futuro, os parâmetros não serão alcançados sem intervenção humana, são elegíveis. A decisão do Brasil foi feita com o objetivo de ter mais áreas elegíveis para projetos de reflorestamento e florestamento.
Um projeto elegível a ser considerado de atividade MDL de pequena escala, pode beneficiar-se das modalidades e procedimentos simplificados, adotados na COP 10 em Buenos Aires, que pretendem reduzir os custos de transação de preparação e implementação. Para propósitos de sistemas florestais, atividades de pequena escala são aquelas que resultam em remoções brutas de GEE, induzidas pelo ser humano, através de remoções de até 8.000 toneladas de CO2 por ano e que são desenvolvidos por comunidades e indivíduos de baixa renda, conforme definição do país hospedeiro do projeto.
  • Dados esses parâmetros, é possível considerar sistemas florestais ou agroflorestais de comunidades de agricultores familiares, envolvendo grupos de projetos de pequena escala (e.g., de associações de agricultores familiares, beneficiários da reforma agrária), que incluem a conjugação de objetivos e atividades agrícolas, pecuárias e florestais.
Passos práticos: 
Para um projeto de carbono MDL de uma comunidade:
  • Demonstração de que a área para florestas é elegível.– Tanto fotos aéreas históricas ou dados de sensoriamento remoto (detecção remota ou teledetecção), quanto cadastros públicos (ou todos, se possível), poderão ser usados para determinar a história florestal de uma parcela de terra para avaliar se será apropriada.
Caso nenhum desse tipo de registros históricos esteja acessível, um testemunho escrito, elaborado através da aplicação de metodologias participativas, poderá ser utilizado para determinar o status da terra, anterior a 10 de janeiro de 1990.
  • Avaliação da capacidade de demonstrar como as atividades do projeto absorvem CO2 de forma adicional ao que ocorreria na ausência da atividade proposta. – Em outras palavras, o projeto deve atender ao critério de adicionalidade. 
Avaliação das taxas de absorção de carbono (ou sequestro) – Alguns projetos terão maior potencial que outros. Isso dependerá do tipo de árvores (particularmente sua taxa de crescimento e densidade) e dos solos para determinar o montante de créditos que potencialmente poderá resultar. Os métodos para avaliar o potencial de remoção de CO2 pela vegetação que será propagada são diversos.
  • Determinação do nível de envolvimento. – A participação de diversos atores é crucial para haver sucesso. Assim, o interesse dos participantes da comunidade é fundamental, bem como uma forte capacidade de organização.
Elaboração de uma minuta de proposta técnica. – Essa proposta proporcionará a base para atrair parceiros e apoio institucional. As ONGs e/ou entidades representativas e articuladas ao setor da agricultura familiar podem dar assistência no processo, devido, em parte, à oportunidade de fortalecimento de organização comunitária que o projeto pode representar. Uma proposta sólida deverá atrair o interesse de potenciais fontes de investimento e compradores de CER de países industrializados.
  • Estabelecimento de uma linha de base do carbono (determinando a linha de base contra a qual a futura remoção de carbono será medida). Para pequenos projetos florestais MDL, se a expectativa da linha de base de estoque de carbono é que permaneça igual ou que diminua na ausência da atividade de projeto, assumir-se-á que as mudanças nos estoques de carbono serão iguais a zero. 
Caso contrário, é proporcionada uma equação específica para calcular esse aumento, utilizando variáveis de densidade, de volume e de fator de expansão da biomassa. Variáveis desenvolvidas localmente ou nacionalmente são utilizadas se estiverem disponíveis. Caso contrário, a CQNUM proporciona ‘valores-padrão’ para serem utilizados nesse estágio do processo.
  • Desenvolvimento de um plano de monitoramento e verificação para monitoramento pela comunidade.– A estrutura do plano deve contemplar a verificação por parte de um terceiro participante. Para poder certificar as RCEs, um terceiro participante, denominado Entidade Operacional Designada (EOD), deve verificar se as atividades informadas e as remoções de carbono estão realmente acontecendo. É requerido o treinamento dos participantes da comunidade em técnicas de rotina para tomar amostras de vegetação e garantir a participação de uma instituição de pesquisa local para auxiliar nesse processo.
Finalização do documento de desenho do projeto (PDD) no formato oficial, que demonstre com clareza a elegibilidade, adicionalidade e adira aos requisitos técnicos acima mencionados. Apresentação do PDD à entidade operacional designada (EOD) para validação.
  • Envio da proposta validada a ser considerada para aprovação pela Autoridade Nacional Designada (AND)  no país receptor e subsequentemente requerer para ser registrada pelo Conselho Executivo do MDL. Essas atividades podem ter como resultado a certificação e a emissão de RCEs e a transferência de pagamentos do comprador.
Projetos de carbono em comunidades rurais brasileiras:
Pro-ambiente – APA-TO
  • O Pro-ambiente, inicialmente um projeto da sociedade civil na Amazônia, tem evoluído no sentido de tornar-se um programa do Ministério do Meio-Ambiente do Brasil, especificamente voltado para compensar serviços ambientais proporcionados pela agricultura familiar, com ênfase na remoção de carbono, na conservação dos recursos hídricos, no uso adequado do solo, eliminação do desmatamento descontrolado e da queimada.
O Pro-ambiente defende que os custos e responsabilidades com o monitoramento e certificação dos serviços globais a serem comercializados devem ser assumidos pelo poder público e/ou empresas privadas. O programa, atualmente com base no ‘arco de desmatamento’ da Amazônia, porém com intenções de se expandir para outras regiões, como o Nordeste do Brasil, foi desenhado e implementado por um grupo de movimentos sociais com apoio de ONGs. Existem onze “pólos pioneiros” em nove estados. A gestão do programa é realizada por um Conselho Gestor Nacional, composto por diversos conselhos, com representação dos atores dos pólos, incluindo entidades executoras e um amplo espectro de entidades sociais, tanto públicas como privadas.
  • A ONG APA-TO, fortemente focada no desenvolvimento social, acompanha as associações em áreas de assentamentos locais e trabalhadores rurais no norte de Tocantins em sua luta pela terra e sua caminhada por uma produção em bases sustentáveis. 
Numa área onde a integridade e resiliência dos ecossistemas vêm sendo degradados pela criação extensiva de gado, grandes monoculturas de soja e extração de carvão para usinas siderúrgicas, a APA-TO é a entidade executora do Pólo Pioneiro do Pro-ambiente no Bico do Papagaio, sendo que as diretrizes políticas do programa são orientadas pelo conselho gestor do pólo, composto por onze organizações representativas dos agricultores e agricultoras familiares e agroextrativistas do pólo. Das 318 famílias que participam voluntariamente, grande parte são beneficiários da reforma agrária, com uma minoria de pescadores e de pequenos proprietários. 
  • Nesse contexto, há um processo organizativo da assessoria técnica social voltada para o desenvolvimento de sistemas agroflorestais e técnicas agroecológicas, bem como para a formação de agentes comunitários dedicados a esses temas. Em nível local, o programa é supervisionado por um Conselho Gestor do Pólo, com representação das diversas associações e dos sindicatos de trabalhadores rurais participantes.
As avaliações rurais participativas, articuladas e priorizadas pelos agricultores familiares tiveram, como resultado, um diagnóstico para cada uma das comunidades e para cada propriedade familiar, proporcionando as bases de uso das propriedades, para um horizonte de 15 anos. Subsequentemente, ‘acordos comunitários de certificação participativa de serviços ambientais’ ou compromissos para o uso responsável dos recursos naturais foram coletivamente definidos e acordados. 
  • Os acordos refletem a realidade de cada comunidade e variam desde a supressão da derruba e queima da vegetação à minimização do uso de agrotóxicos, ao reflorestamento de áreas ribeirinhas, e à conscientização da vizinhança. Algumas comunidades têm estabelecido reservas naturais administradas pela comunidade.
O não-cumprimento dos acordos comunitários é tratado em reuniões periódicas. A maioria dos participantes informa que mudaram suas práticas de produção como resultado dos acordos comunitários participativos. 
  • Alguns agricultores estão revertendo o desmatamento e estão gerando ingressos maiores e mais diversificados. Um dos agricultores entrevistados tinha iniciado as práticas agroflorestais antes dos acordos da comunidade, proporcionando assim valioso exemplo dos benefícios desse modo alternativo de uso do solo. O agricultor consegue auferir mais do que um salário mínimo em três hectares de terra, usando o sistema agroflorestal integrado com apicultura. 
Tem-se informação de que tais sistemas trazem muitos outros benefícios locais, dado que os membros das famílias estão mais integrados no processo de produção e comercialização e trabalhando em melhores condições. Muitos representantes dessas famílias têm-se transformado em agentes (essencialmente produtores com liderança técnica exercendo relevante função em sua comunidade, com base no sucesso dos agentes comunitários de saúde contratados pelo Ministério da Saúde), trabalhando para o programa Pro-ambiente.
  • Um outro componente chave para a promoção do uso sustentável é a educação ambiental e ecológica, que desperta a consciência em relação às opções de uso do solo. Um importante membro da Rede Pro-ambiente é uma associação regional de mulheres trabalhadoras rurais bem organizada, denominada ASUMBIP. A mesma vem promovendo a conscientização das pessoas a respeito do extraordinário valor do Babaçu, uma palmeira nativa que normalmente é pouco valorizada. 
Além disso, apesar da enorme capacidade de recuperação do resiliente babaçu, essa palmeira normalmente é erradicada por agricultores e fazendeiros que buscam ganhos financeiros de curto prazo, com a criação de gado, por exemplo. 
  • A organização está resgatando o valor tradicional dessa palmeira, onde são consideradas opções alternativas de uso e conseqüências no bem-estar, em decorrência do manejo extrativista. A associação vem promovendo o aumento da colheita e o processamento dos frutos do babaçu para comercialização dos seus diversos derivados (amêndoas, óleo, mesocarpo, torta de babaçu, artesanato etc), via pequenas agroindústrias.
O pagamento por serviços ambientais é um incentivo direto para o estabelecimento de acordos e melhoria no manejo dos recursos. Em 2006, foram feitos os dois primeiros pagamentos, correspondentes a seis meses e equivalentes a R$ 100,00 por mês, valor pago em duas parcelas, que foram muito bem recebidos pelos participantes do Pro-ambiente. 
  • A atribuição do valor monetário aos serviços ambientais proporcionados pelos agricultores foi feita com base na capacidade orçamentária e disposição do governo para a remuneração dos serviços e a disposição do provedor de serviços na mudança de comportamento ambiental em contrapartida a esta remuneração, estipulada por família participante. Como o governo é o único comprador, não se estabelece um mecanismo concorrencial de mercado propriamente dito para o estabelecimento do preço ou valor. 
Um sistema de pagamentos por serviços ambientais, com planejamento de longo prazo está em discussão no Ministério do Meio Ambiente, devendo propor uma legislação instituidora após consulta ampla à sociedade. A proposta é de que o pagamento por serviços ambientais seja uma política pública nacional.

Instituto Ecológica
  • O Instituto Ecológica foi fundado como uma ONG e tem se transformado em uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). Sua missão principal é reduzir os efeitos das mudanças do clima através de pesquisa, conservação e preservação do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável das comunidades rurais. 
O Instituto trabalha com projetos direcionados à avaliação ambiental e à promoção da educação ambiental no sul do estado de Tocantins. Têm-se estabelecido parcerias com entidades multilaterais como o BID, o setor privado, instituições de pesquisa e programas governamentais.
  • Através de projetos de cunho experimental, como o de sequestro de carbono na Ilha do Bananal, o conceito de ‘carbono social’ foi desenvolvido para gerar reduções de emissões de gases de efeito estufa e/ou remoções de CO2, tendo, como foco prioritário, os aspectos sociais. 
Foi desenvolvida uma metodologia de carbono social, baseada na Abordagem de Meios de Vida Sustentáveis, por meio da qual os impactos das intervenções são avaliados com base na percepção das comunidades a respeito das mudanças no seu acesso aos recursos, utilizando critérios de biodiversidade, carbono, finanças, humano, social e natural. O centro de pesquisas Canguçu, estabelecido na Ilha do Bananal pela Ecológica, proporciona uma base de operações para pesquisa no desenvolvimento de metodologias de monitoramento de carbono e estudos de biodiversidade regional.
  • Embora a medição dos estoques de carbono agroflorestal ainda não tenha sido iniciada, têm sido realizados estudos de linha de base a respeito do conteúdo de carbono de diferentes tipos de florestas dos diversos ecossistemas da região (floresta tropical, cerrado e Pantanal). Os resultados facilitam a estimação das toneladas de dióxido de carbono equivalentes removidas por hectare por ano (tCO2eq / ha./ano) para diversos tipos de árvores.
Tem sido desenvolvido um selo de carbono social, por meio do qual agricultores familiares participam de um processo de treinamento para comercializar produtos florestais não-madeireiros. Os produtos são identificados, desenvolvidos e padronizados para aderir a normas de qualidade nacionais, facilitando o acesso a mercados maiores. 
  • As comunidades estão usando frutas e sementes de plantas nativas para produzir bijuterias; conservas e licores visando adquirir o selo de carbono social. Os produtos resultantes têm demonstrado o importante valor da preservação das árvores frutíferas nativas do bioma Cerrado. Também está sendo projetada a extração de óleos de plantas nativas como pau d´oleo, sucupira, baru, buriti e pequi, entre outras, para a comercialização e contribuição na geração de renda das comunidades.
Em parceria com o SEBRAE, organização de âmbito nacional para a promoção da microempresa, a Ecológica vem acompanhado uma empresa de cerâmica vermelha, que utiliza tecnologia adaptada para queimar cascas de arroz em substituição à lenha, que normalmente é extraída de forma ilegal do cerrado. Os custos de produção têm sido reduzidos, e o projeto prevê uma diminuição no desmatamento local. 
  • A empresa tem iniciado um projeto MDL, pois as emissões de metano provenientes das cascas do arroz serão reduzidas. Outras empresas de cerâmica da vizinhança estão se propondo a mudar para a casca de arroz. Não está claro se haverá resíduos suficientes de casca de arroz gerada localmente para satisfazer à crescente demanda, nem como serão afetados aqueles que vendem lenha.

Projeto MDL da hidrelétrica Jirau recebe carta de Aprovação do 
Governo Brasileiro

Agricultura Familiar: 
Projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. É possível?
Implicações para Projetos MDL  Com comunidades rurais no Brasil:
  • As experiências relatadas utilizam abordagens de planejamento participativo e ascendente (desde a base para cima) e proporcionam valiosa informação para avaliação da viabilidade de projetos comunitários MDL agro-florestal de pequena escala. O uso de sistemas diversificados (sobretudo os sistemas agroflorestais) cumpre papel ecológico de prestação de serviços ambientais em escala de paisagem rural, desde que os arranjos institucionais locais demonstrem capacidade de estabelecer redes e laços de confiança.
Os acordos comunitários inovadores do Pro-ambiente têm resultado na definição, por parte dos agricultores familiares, de seus direitos de propriedade. Acordos semelhantes na Amazônia, para promover a pesca sustentável em lagos, tiveram como resultado um aumento de rendimentos de 152% e, ao mesmo tempo, a estabilização da população de peixes. As normas do uso e manejo dos recursos, ao serem formalizadas coletivamente, tornam-se menos vulneráveis a forças externas, como mudanças nos preços de madeira e de lenha, especulação de terras, etc.
  • As experiências têm desenvolvido um valioso conhecimento agroflorestal para agricultores e equipes técnicas, mas a lenta adoção de práticas agro-florestais é uma função da ausência de crédito e de assistência técnica, entre outros fatores, fazer com que aqueles que planejam o crédito entendam os sistemas agroflorestais é essencial para que sejam elaborados programas apropriados. A incorporação de potenciais vendas de carbono e pagamentos por serviços ambientais como parte desses programas tornará os sistemas agroflorestais mais factíveis aos agricultores familiares.
O Instituto Ecológica e seus parceiros de pesquisa têm demonstrado o valor dos serviços da remoção de carbono. Pela medição do aumento da biomassa no tempo é possível calcular o conteúdo de carbono e de dióxido de carbono equivalente. O preço de CO2eq determinará o pagamento potencial por hectare por ano.
  • O IPCC prognostica um valor médio de 120 toneladas métricas de carbono por hectare de estoque de biomassa na superfície da terra em floresta tropical, o que representa 440 t CO2eq. O lucro potencial da remoção de CO2 pelos agricultores familiares no sistema agroflorestal de um acumulado de 25 anos, que resulta em 70 toneladas de carbono por hectare com um preço de U$3,50 / tCO2eq, é de U$ 35.95 (ou, aproximadamente, 10 tCO2e) por hectare, por ano. O montante que chega às mãos dos agricultores familiares dependerá dos custos de transação.
Nos centros pioneiros do Pro-ambiente esses custos poderão ser zero, posto que se pretende que o poder público e/ou empresas privadas assumam os custos de monitoramento e certificação. Ambas as iniciativas têm demonstrado que os sistemas agroflorestais são complexos e podem levar mais de três anos antes que os benefícios se façam evidentes. 
  • Intercâmbios e trocas de experiências são formas eficientes de compartilhar conhecimentos em solos, espécies nativas, pragas, doenças, padrões de precipitação e muito mais. O processo agroflorestal envolve investimento no desenvolvimento de capacidades, educação ambiental e o desenvolvimento de consensos entre as partes participantes.
No Brasil, mais de 1.011 experiências agroecológicas têm sido identificadas pela Articulação Nacional de Agroecologia. A venda de carbono poderá trazer novos ingressos financeiros para essas iniciativas e similares que poderão complementar o processo em andamento facilitando a ampliação dos objetivos. Superando barreiras para uma comunidade ingressar em um projeto florestal MDL

Informação:
  • Possivelmente, a maior barreira para o acesso, neste momento, é a falta de informação. Muitas organizações de pequena escala e movimentos sociais não estão conscientes ou receptivos aos trabalhos do MDL. Apesar dos procedimentos, modalidades e propostas estarem accessíveis ao público, poucos tem o tempo ou recursos para avaliar a informação. No Brasil, o mercado de carbono está dominado por grandes corporações que têm recursos para interpretar e obter o máximo das oportunidades.
Elegibilidade:
  • Alguns projetos podem ser inelegíveis por não reunirem as definições florestais referentes ao ano-base 01/01/1990. Esse é o caso, por exemplo, de algumas áreas ao sul de Tocantins, que têm sido densamente povoadas desde 1989.
Também poderá ser difícil para áreas vulneráveis à desertificação, como áreas do semi-árido, conseguir um nível mínimo de definição de floresta, particularmente com relação às árvores, que dificilmente alcançarão a altura mínima de cinco metros. Assim, é aconselhável confirmar a elegibilidade com antecedência.

Posse da terra:
  • O padrão de posse e uso da terra no Brasil nas ultimas décadas, apesar de alguns avanços, ainda traz consigo a tendência histórica de conflitos fundiários, alta pressão sobre os recursos naturais e processo intenso de exclusão social dos produtores familiares rurais. A propriedade dos direitos sobre os créditos de carbono se torna um assunto nebuloso quando a terra da qual provem estes créditos pertence ao estado, ou quando o direito de propriedade não está claramente definido.
Parece haver uma relação significativa entre a posse da terra e a permanência da remoção de carbono. A posse da terra serve de garantia para participar em programas de crédito e facilita investimentos e planejamento no longo prazo.

Custos de transação:
– viabilidade econômica
  • De acordo com o MDL, a maior parte dos custos de transação relacionados à geração e a venda das RCEs acontece na fase de planejamento e desenho, muito antes do início efetivo do projeto. Os primeiros lucros da venda de RCEs poderão ser requeridos para cobrir os custos de transação. Dado um valor de U$5 por tonelada de CO2eq, os custos de transação mínimos calculados variam entre US$ 30,000 a US$ 70,000. 
Assim, um projeto com um rendimento inferior a 15,000 CO2eq, ao longo de seu período de vigência será inviável sob as atuais condições do MDL. Some-se a isso os custos de financiamento dos custos de transação que ocorrem no início. Se os preços do carbono aumentarem e os custos de transação diminuírem os projetos serão mais factíveis.

Organização:
Projetos florestais de pequenas comunidades estão limitados a 8.000 remoções de CO2eq por ano. 
  • O tamanho resultante do projeto varia entre 204 ha para espécies de crescimento rápido em florestamento e até 3.500 ha. para sistemas agroflorestais.63 Com uma média de tamanho de lote de 5 ha por família seria necessário a participação de 40 a 700 famílias. 
A organização de diversos participantes ou agrupações de pessoas que não moram em terras contíguas ou assentamentos significará elevar os custos de transação para o monitoramento por hectare. A manutenção do compromisso dos produtores com o florestamento vai depender dos cuidados que os produtores dedicam às suas propriedades; da diversidade de ecossistemas na área de projeto, o que pode resultar em maior complexidade no acompanhamento e monitoramento.Grupos comunitários são formados por múltiplos atores com múltiplos interesses e percepções das prioridades de desenvolvimento (e.g. geração de renda, direitos locais de propriedade, etc.). 
  • A participação voluntária em um projeto de carbono e o desenvolvimento de acordos comunitários devem contribuir na manutenção da união do grupo. Eis aqui um aspecto que requer um amplo processo de mobilização, debate e aprofundamento de diretrizes que orientem o grupo para uma gestão participativa, a partir das dinâmicas organizativas já existentes, em nível local.
É possível que as comunidades mais pobres e mais vulneráveis tenham menor capacidade de organizar um projeto complexo como requerido pelo MDL e, portanto, existe o risco de que os mais fragilizados sejam postos de lado e os projetos MDL criem uma brecha ainda maior entre os ricos e os pobres, em nível local..

Tecnologia:
  • O sucesso na implementação dos sistemas agroflorestais, na perspectiva do MDL, dependerá, em grande parte, do desenvolvimento de capacidades relativas à propagação das arvores; à identificação das plantas apropriadas (leguminosas e oleosas, etc.) para o estabelecimento de consórcios; ao manejo das sequências temporais inerentes ao processo de sucessão; à identificação da vegetação com capacidade de retenção e melhor aproveitamento de água, entre outras. 
Tecnologias apropriadas, como sistemas de captação e armazenamento de água de chuva, bancos de sementes nativas e agrícolas e fogões eficientes no uso de combustíveis podem ser integradas no sentido de proporcionar maior estabilidade e autonomia ao agroecossistema. 
  • Contudo, a mudança tecnológica que, em essência, é mudança de comportamento, tem provado ser uma tarefa difícil, que requer formação e animação continuadas, no sentido de promover ganhos qualitativos paulatinos na percepção e conhecimento, de forma indissociável da prática. Habilidades para a coleta de amostras e a manutenção de registros pertinentes à quantificação de carbono poderão ser desenvolvidas concomitantemente, em colaboração com instituições de pesquisa e ensino, e multiplicadas através do intercâmbio de experiências entre agricultores familiares.
Caso as alternativas propostas para o uso da terra, como sistemas agroflorestais, não sejam igualmente ou mais rentáveis do que as práticas atuais, é provável que os projetos venham a ter o desafiante dilema de priorizar o desenvolvimento social ou a geração de remoções de CO2.

Instituições:
  • Os projetos requerem a construção de consensos entre os diversos atores, incluindo as associações de agricultores; movimentos sociais e ONGs; autoridades locais estaduais e nacionais; instituições de pesquisa e ensino; corretores internacionais de carbono, etc. A identificação de processos, procedimentos e caminhos relativos à articulação institucional e construção de consensos é crucial para que os agricultores familiares possam constituir ou fortalecer uma entidade para articular e negociar politicamente suas demandas.
Complexidade:
  • As regras do MDL, especialmente para projetos florestais, são criticadas pela sua relativa complexidade. Isso foi considerado necessário para conseguir os acordos à medida que as negociações foram evoluindo no tempo. Projetos relacionados à energia são mais fáceis de quantificar e têm menor risco de não-permanência e fuga. Na eventualidade de um incêndio florestal durante o período de credenciamento, o comprador terá de renovar os créditos. 
Por causa do risco da reversão das remoções de CO2 através de sua re-liberação à atmosfera, os ‘créditos florestais’ são considerados temporários ou de largo prazo.
  • Por essa razão e também pelo fato da comprovação de projetos florestais ser mais complexa e controvertida, e por isso se dar de maneira mais questionável no âmbito das negociações internacionais, em comparação aos projetos de geração de energia, os preços pagos por créditos ‘florestais’ de carbono tendem a serem menores que aqueles de RCEs não ‘florestais’.
Padrões de qualidade, como os “Padrões para o Desenho de Projetos sobre Clima, Comunidade & Biodiversidade (CCB Standards)”, permitem a identificação de projetos que simultaneamente mitigam as mudanças do clima, apóiam comunidades locais e conservam a biodiversidade, dando assim credibilidade e clareza, bem como reduzem os riscos para o investidor do projeto. Projetos voluntários dos mercados de carbono evitam algumas das complexidades e custos dos projetos MDL. 
  • O Projeto Nhambita em Moçambique, por exemplo, é um projeto agroflorestal de remoção de CO2 e de redução de pobreza, no qual as remoções de CO2 verificadas são compradas voluntariamente por indivíduos, organizações e empresas. Mas até municípios ou entidades do poder público são compradores potenciais.
Escala:
  • Embora se considere que os altamente diversificados sistemas agroflorestais de pequena escala oferecem maiores benefícios sociais e ecológicos, as remoções de CO2 promovidas por grandes plantações de uma única espécie com índices de crescimento uniforme (monocultura), como eucaliptos e pinho, são mais fáceis de quantificar e poderão ser mais fáceis de organizar. Portanto, monoculturas florestais tendem a ser mais atrativas para os corretores de carbono. 
Contudo, nesses sistemas, nem todos os custos estão sendo considerados: tais monoculturas podem afetar negativamente o ciclo hidrológico e reduzir drasticamente a biodiversidade e a disponibilidade de terra e o trabalho para a população local.

Críticas a Quioto e ao MDL:
  • Durante o processo de entrevistas para esta pesquisa foram manifesta das dúvidas com relação ao MDL, especialmente sobre as possibilidades e modos do mecanismo vir a beneficiar grupos tradicionais, indígenas e agricultores familiares. Para muitos, no momento, parece ser um macro-mecanismo ‘surrealista’ para grandes jogadores. 
As regras são bastante complexas e desmotivadoras. Há, portanto, a necessidade de debate no sentido de encontrar respostas para estas dúvidas. Alguns dos ‘desenvolvimentos limpos’ dentro do contexto florestal podem não ser tão limpos, onde extensas monoculturas de plantas exóticas substituem ecossistemas frágeis e, muitas vezes únicos, para a produção de bio-combustíveis ou celulose.
  • Uma crítica comum ao Protocolo de Quioto é que as reduções de emissões não são suficientes. Austrália e Estados Unidos (os maiores emissores de GEE per capita e os maiores emissores em termos totais, respectivamente) não tem ratificado o Protocolo e argumentam prejuízos de enorme monta e que gigantes emergentes, como a China, deveriam ser obrigados a limitar suas emissões, apesar das emissões chinesas para geração de energia serem inferiores à média mundial per capita. Estima-se que para se manter o aumento da temperatura abaixo dos níveis pré-industriais de 2°C, há necessidade de aumentar progressivamente os compromissos posteriores a 2012. Alguns argumentam algo em torno de 80% para o 205068.
As RCEs mais atrativos para os corretores são aqueles projetos de grandes volumes e baixos custos como gás de aterros de lixo e remoção de HFCs, com limitados benefícios para o bem-estar local. Poucos são os projetos que apresentam progressos significativos no sentido de alcançar os aspectos sociais, econômicos e ecológicos do desenvolvimento sustentável.
  • O Projeto Plantar, por exemplo, em Minas Gerais, Brasil, tem sido criticado por mais de 70 sindicatos, grupos religiosos e indivíduos que escreveram uma carta dirigida ao Conselho Executivo do MDL, questionando como a companhia inicialmente adquiriu a terra para um plantio de eucaliptos de grande escala para a captura de carbono. 
A companhia tem sido reprovada por uma deficiente administração ambiental, condições de trabalho perigosas e a permanência e estabilidade do sequestro de carbono tem sido questionada. Sequer um projeto florestal comunitário de pequena escala, com elevado potencial de dividendos de desenvolvimento, tem sido registrado no MDL em nível global. 
Pergunta-se como os mecanismos podem ser melhor desenvolvidos para que o dinheiro do carbono possa chegar às mãos de agricultores familiares empobrecidos e não para os donos de extensas propriedades, que são responsáveis por grande parte do desmatamento?
As regiões mais pobres do mundo lutam para conseguir investimentos estrangeiros diretos via o MDL. Até outubro de 2006, a maioria dos projetos MDL registrados estão concentrados no Brasil e na Índia, e dos 386 projetos, somente nove na África, e estes com base nos países relativamente melhor desenvolvidos da África do Sul e dos estados do Norte da África.
  • No momento, não há incentivos explícitos sobre o MDL para evitar o desmatamento. A combinação de incentivos financeiros para o plantio de novas florestas e a inexistência de incentivos ou incentivos insuficientes para preservar a floresta (tropical) existente pode encorajar um comportamento perverso, com as florestas sendo derrubadas para logo serem replantadas. Sem um mecanismo que valorize a floresta em pé, a floresta apresenta potencial de ser desmatada, sobretudo nas áreas de fronteira agropecuária da Amazônia Brasileira.
Alguns argumentam que negociar as emissões é uma forma de evitar responsabilidades e de que os mercados de emissões são uma outra tentativa de transformar em commodities os recursos naturais e de transformar a capacidade cíclica do carbono do mundo em um produto (ou serviço) que pode ser comprado ou vendido.
  • Por outro lado, também poderá se argumentar que, no passado, valores monetários não foram atribuídos para os serviços sócio-ambientais do carbono. Portanto, que seu valor social tem sido ignorado por políticos, empresários e público, o que conduziu à degradação ambiental e à exaustão dos recursos naturais.
O maior perigo para a maioria de nós não é que nossa aspiração seja muito alta e a percamos, mas que seja muito baixa e a alcancemos. Michelangelo (1475-1564)

Outras Considerações:
  • O MDL do Protocolo de Quioto tem suas deficiências e suas regras precisam ser rediscutidas para viabilizar projetos agroflorestais de pequena escala. No entanto, o problema do aquecimento global requer uma solução global onde é fundamental a construção de consensos internacionais, pondo mais ênfase nas realidades sociais, econômicas, culturais e ecológicas dos países em desenvolvimento hospedeiros dos projetos. O Protocolo de Quioto, como um dos principais acordos internacionais de meio ambiente do mundo, só poderá ser bem-sucedido, na medida em que o mecanismo de comércio de emissões seja realmente funcional e efetivo.
O desenho, implementação e monitoramento dos projetos MDL agroflorestais de pequena escala podem estar dentro da capacidade das comunidades bem organizadas de países em desenvolvimento. Mas muitos desafios e barreiras de ingresso precisam ser superados para tais projetos serem registrados e para que os créditos se destinem aos agricultores familiares.
  • É requerido urgentemente melhor entendimento das mudanças do clima, do Protocolo de Quioto e seu Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e das alternativas ao próprio MDL para proporcionar melhor informação, incentivos, investimentos, infra-estrutura e instituições com capacidade de mobilização, articulação e negociação política.
Tem-se estabelecido um consenso praticamente universal de que a causa principal do Aquecimento Global são os aumentos globais na concentração dos GEE, que se devem, sobretudo, ao uso de combustíveis fósseis e a mudanças no manejo da terra. Tomando como exemplo a Irlanda, o país está entre os mais poluidores de GEE per capita do mundo, o Ministro do Meio Ambiente, disse que Irlanda irá comprar até 3,6 milhões de créditos (dos três mecanismos flexíveis), cada ano entre 2008 e 201275. No entanto, não está claro quantas reduções virão do MDL.
  • Além de reduzir fortemente suas emissões, os países industrializados deveriam compensar os países em desenvolvimento para adaptar-se às conseqüências das mudanças do clima. Alguns desses países certamente comprarão créditos de países em desenvolvimento, mas devem não somente considerar a quantidade e o preço dos créditos, mas também por ênfase em sua qualidade (usando indicadores sociais, econômicos e ecológicos). Projetos agroflorestais comunitários de pequena escala, se forem passíveis de implementação, dentro das regras de MDL, o mais provável é que aumentem a qualidade das RCEs, na medida em que contribuem em alto grau para a dupla aspiração do MDL (remoção de emissões e contribuição ao desenvolvimento sustentável). 
Os países industrializados que não cumprirem seus compromissos, ao comprar uma quantidade significativa desses créditos, estarão, de fato, investindo na capacidade de países em desenvolvimento se adaptarem às mudanças do clima.

O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) é o principal instrumento de flexibilização das metas de diminuição de emissões de Gases de Efeito Estufa, criados pelo Protocolo de Kyoto, e é aplicável a projetos em países que não têm metas de redução de emissão de GEEs.