domingo, 13 de dezembro de 2015

Os Agrotóxicos à Saúde e o Meio Ambiente

Uso dos Agrotóxicos e Seus Impactos à Saúde e ao Ambiente

  • As ciências econômicas em sua definição clássica têm como objeto produzir a maior quantidade de bens e serviços de forma eficiente, com o propósito de atender às necessidades dos agentes a partir do uso dos recursos os quais se assume que são escassos (Sandroni, 1994). 
Sendo assim, o problema econômico de escassez dos recursos em certo sentido se confunde com o problema ecológico de desequilíbrio dos sistemas baseados em organismos vivos: a escassez leva ao desequilibro e vice-versa.
  • No entanto, algumas correntes da economia vêem o sistema ecológico como um agente externo e passivo, cujos desequilíbrios ocasionados pelo mau funcionamento do sistema econômico com o tempo são estabilizados. Uma outra corrente, a dos economistas ecológicos, pensa o sistema econômico como parte de um sistema maior, com o qual se relaciona, e a sua estabilidade estaria sujeita às formas com que essas relações acontecem. 
Baseiam-se não apenas no princípio da eficiência, mas sobretudo na equidade e na justiça ambiental, e defendem a idéia de que o acúmulo de ações antrópicas aos ecossistemas poderia resultar em alterações potencialmente desestabilizadoras e consequentemente irreversíveis (Costanza, 1991; May, 1995; Daly & Farley, 2004)1.
  • Os economistas ecológicos concordam com as outras correntes da economia quando dizem que os ecossistemas possuem uma capacidade de resiliência, ou seja, uma habilidade de se manter auto-organizado em face de choques ou de estresse. 
No entanto, apregoam que existe um limite de resiliência para cada ecossistema, como é o caso da desertificação em decorrência das ações humanas na agricultura em ambientes extremamente frágeis (Mueller, 2007), ao passo que a economia neoclássica despreza essa perspectiva por acreditar ser sempre possível superar tais limites pelo avanço incremental da própria tecnologia. 
  • Em relação à questão dos agrotóxicos, o modelo de agricultura baseado no uso intensivo desses insumos também exige grande resiliência dos ecossistemas, pois, além da poluição química, tal modelo se apóia amplamente no aumento de produtividade baseado em plantações de uma única espécie (monocultura), eliminando a biodiversidade local. 
Portanto, esse tipo de problema passa a ser tanto dos economistas quanto dos ecologistas, ou melhor, é um típico problema da economia ecológica.
  • Um sistema de produção agrícola por si só já reduz a diversidade biológica do ambiente a partir da transformação de um ecossistema em um agrossistema. Esse desequilíbrio é quase que completo quando se trata de monoculturas, que são agrossistemas extremamente simplificados e, portanto, mais suscetíveis ao aparecimento de espécies nocivas à cultura plantada. 
Segundo Bergamin et al. (1995) o cultivo de plantas geneticamente homogêneas favorece o aumento da população de patógenos e pragas de forma epidêmica. Hoje, no Brasil, a pressão sobre os ecossistemas a partir da agricultura é elevada, uma vez que estabelecimentos com mais de 1000 hectares representam 43% das terras agrícolas no país (IBGE, 2006).
  • De acordo com Caporal (2008), essa simplificação vem levando ao desequilibro ecológico, com o rompimento de cadeias tróficas, à artificialização das áreas de produção e a uma necessidade permanente de subsídios externos, como é o caso dos agrotóxicos e fertilizantes. 
O problema passa a ser ainda pior quando há o uso intensivo desses insumos, pois os agrotóxicos, além de erradicarem as pragas, também eliminariam seus inimigos naturais, ou seja, seus predadores e competidores. Acrescenta-se o fato do aumento de resistência por parte das pragas, que passam a tolerar doses que antes matavam quase a totalidade de seus progenitores (Paschoal, 1979). 
  • A questão é que modelos agrícolas baseados em monoculturas e na ampla simplificação de biodiversidade somente se sustentam à custa do uso excessivo de agroquímicos. No entanto, seus impactos não podem ser vistos como fatos isolados em um sistema econômico, tampouco ecológico (Wilson & Tisdell, 2001).
Consequentemente, não há sustentabilidade quanto ao uso dos agrotóxicos, pois a sua necessidade aumenta cada vez mais, como uma espécie de ciclo vicioso (Alves Filho, 2001). Por exemplo, entre 1940 e 1984 as perdas das culturas por ataques de insetos, nos EUA, aumentaram de 7% para 13%, enquanto o uso de pesticidas aumentou 12 vezes.
  • Em síntese, a Economia Ecológica vem acenar que a capacidade das gerações futuras de atender as suas necessidades está em cheque, tendo em vista o comportamento humano acerca do seu estilo de desenvolvimento. 
Além de compartilhar com outras correntes da economia, como a da economia ambiental neoclássica, no que diz respeito às falhas de mercado, ao uso de instrumentos econômicos de regulação e tecnologias limpas que reduzem os incentivos à poluição, também incorporam a necessidade de se analisar o problema de forma mais ampla, transdisciplinar, e priorizar políticas que introduzam mudanças profundas de estilos de desenvolvimento.
  • No caso dos agrotóxicos, um economista ecológico pensaria, de forma sistêmica e complexa, em instrumentos de regulação do uso desses insumos, ao mesmo tempo apontando para alternativas tecnológicas geradoras de produções mais sustentáveis. 
Por exemplo, a agricultura orgânica, que tem o objetivo de aumentar e sustentar as interações biológicas nas quais a produção agrícola está baseada, ao contrário de reduzi-las e simplificá-las (National Research Council, 1989). 
  • Tampouco, os economistas ecológicos minimizariam o papel do consumo responsável, pois colocariam os consumidores como agentes fundamentais, ao exigirem um produto mais limpo e isento dos danos a sua saúde e à das futuras gerações.
Agrotóxicos: 
O custo-benefício privado versus o social:
  • Sob o ponto de vista estritamente econômico, na ótica privada do agricultor, vale a pena comprar e utilizar o agrotóxico quando o seu custo encontra-se menor do que o benefício esperado na produção. 
Os benefícios dos agrotóxicos ao produtor já estão de certa forma embutidos nos preços desses insumos e por sua vez são repassados aos consumidores através desses valores sobre o preço final dos alimentos. Já os danos ambientais e à saúde humana provenientes do uso desses insumos não são carregados no processo produtivo, ou seja, nem os preços dos agrotóxicos refletem esses custos, tampouco os preços dos produtos agrícolas colocados à venda no mercado. 
  • É um custo absorvido por toda a sociedade sob as mais diferentes maneiras, mas que não é diretamente percebido por essa. É um custo externalizado nas planilhas do Ministério da Saúde ao se repassar verba para o atendimento médico-hospitalar no Sistema Único de Saúde, nas despesas do Ministério da Previdência Social para concessão dos benefícios, dentre outros gastos governamentais ou não.
Nesse caso, na presença desses custos externos ou externalidades, percebe-se que o benefício privado não se reflete em benefício social, ou melhor, que a estimativa de um benefício socialmente desejável é obtida pela maximização da função de bem estar social e não através de uma função exclusivamente privada. A reta positivamente inclinada representa o benefício do uso do agrotóxico, que aumenta à medida que cresce o potencial de perda de colheita evitada por esse produto.
  • Já o custo na perspectiva do fazendeiro é representado pela curva CPP, onde A é o nível ótimo de consumo de agrotóxicos numa perspectiva privada, tendo em vista que esse consumo maximiza o benefício líquido do fazendeiro (benefício - custo). Entretanto, sob a perspectiva de bem-estar social, há um custo externalizado por essa atividade produtiva privada e que representa os danos à saúde do trabalhador. 
Nesse caso, se os custos de curto prazo, ou seja, aqueles associados à intoxicação aguda, fossem internalizados pelo produtor, a curva de custos do uso dos pesticidas mudaria para CCP, e B passaria a ser o nível ótimo de consumo de agrotóxico. A redução do uso dos agrotóxicos seria ainda maior, se o produtor internalizasse os custos de longo prazo. 
  • Por exemplo, ao se incorporar os problemas crônicos, a curva de custos passaria a ser representada por CS, que nada mais é do que a curva que internaliza os custos sociais dos agrotóxicos associados à saúde (custo privado com a compra e aplicação dos agrotóxicos + intoxicação aguda + problemas crônicos). 
Nesse caso, quando internalizamos esses custos no processo produtivo, a maximização do benefício numa perspectiva social seria a de um consumo de agrotóxico no nível C, extremamente menor.
  • Essa figura é um exemplo claro do papel das políticas governamentais ou das ações específicas em âmbito local cujo propósito é a racionalização do uso dos agrotóxicos à luz de uma perspectiva de convergência entre os interesses econômicos, ambientais e da saúde pública. Políticas que internalizam o custo privado dos agrotóxicos são pautadas tanto no comando e controle dessas substâncias quanto na geração de desincentivos econômicos. 
Afinal de contas, a contradição, que não aparece claramente no ambiente de tomada de decisão individual, aparece com bastante força e com mais clareza ao se olhar o problema numa perspectiva sistêmica e social sob a ótica da sua complexidade: o “remédio” que o agricultor utiliza para eliminar a doença e dano às plantas é o mesmo que provoca problemas ambientais, de saúde e a morte de seres humanos.

Agrotóxicos no Brasil.:
  • Os agrotóxicos começaram a se popularizar em plena segunda guerra mundial, quando o mundo conheceu uma revolução no que diz respeito ao controle de pragas na agricultura, o DDT. Esse produto ficou rotulado como de baixo custo e eficiente, o que muito ajudou que se fosse amplamente utilizado antes que seus efeitos nocivos tivessem sido totalmente pesquisados. 
O grande sucesso desse produto no combate às pragas fez com que novos compostos organossintéticos fossem produzidos, fortalecendo a grande indústria de agroquímicos presente nos dias de hoje. O crescimento do uso desses insumos químicos somados a um processo de desenvolvimento e difusão de variedades modernas com elevada capacidade de aproveitamento desses produtos ficou conhecido como a “revolução verde” (Bull & Hathaway, 1986).
  • Segundo Kissmann (1996) uma das formas de se avaliar a eficiência desse modelo de agricultura era mensurar o número de pessoas que um agricultor, além de si mesmo, seria capaz de alimentar. Em 1950 esta relação era de 1 para 10, passando a 1 para 17 em 1960, 1 para 33 em 1970 e de 1 para 57 em 1980. Já em 1988, chegou a 1 para 67, ampliando-se, em 1991, de 1 para 71. 
Resumindo, a sua bandeira era simplesmente o aumento da capacidade de geração de oferta de alimentos sem precedentes. Deve-se ressaltar que esse mesmo autor reconhece que o aumento da produtividade não se deve exclusivamente ao emprego dos agrotóxicos, mas, principalmente, ao melhoramento genético das plantas (50%) e à crescente mecanização no campo.
  • No Brasil, o uso dos agrotóxicos começou a se difundir em meados da década de 40. No final da década de 60, o consumo se acelerou em função da isenção de impostos como o Imposto de Circulação de Mercadoria (ICM), Imposto de Produtos Industrializados (IPI) e das taxas de importação de produtos não produzidos no Brasil e aviões de uso agrícola (Bull & Hathaway, 1996). 
Em adição aos seus efeitos no combate às pragas, o aumento de tecnologia e renda dos agricultores também contribuiu para que as vendas dos defensivos aumentassem significativamente e passassem de US$ 40 milhões, em 1939, para US$ 300 milhões e US$ 2 bilhões em 1959 e 1975, respectivamente (Paschoal, 1979). 
  • Esse aumento se deveu a uma política oficial de incentivo, reforçada em 1975, pelo lançamento do Programa Nacional de Defensivos Agrícolas (PNDA). Segundo Pessanha & Menezes (1985, apud Andrade, 1995), o governo federal investiu mais de US$ 200 milhões na implantação e desenvolvimento das indústrias, provocando profundas transformações no parque industrial do país. 
Por outro lado, a vinculação entre a ampliação do crédito agrícola subsidiado e a compra de defensivos foi um dos principais instrumentos específicos voltados para ampliar a difusão desses insumos.
  • Ao condicionar o crédito rural à compra do agrotóxico, o Estado foi o principal incentivador do pacote tecnológico que representava a modernidade na agricultura, passando o mercado brasileiro a figurar entre os mais importantes para a indústria dos agrotóxicos. 
A “reboque” desse crescimento no consumo, cuja aquisição se dava, em sua maioria, via importação, muitas empresas multinacionais se instalaram no parque industrial das Regiões Sul e Sudeste no final da década de 70. Nos anos 70 e 80, o Brasil implementou um programa de incentivo à produção local, resultando um salto do ponto de vista tecnológico, com a síntese de diversas moléculas, chegando a produzir localmente 80% do volume demandado (MIDC/SDP, 2004).
  • No entanto, o Brasil apenas seguiu uma tendência mundial, ou seja, os incentivos governamentais faziam parte de uma política mundial para países em desenvolvimento, tampouco exclusiva para o país. Um estudo realizado pela FAO em 38 países em desenvolvimento, revelou que 26 deles subsidiavam o uso de fertilizantes (FAO/IFA, 1999). 
Em síntese, pode-se dizer que o emprego dos agroquímicos sem precedentes na atividade agrícola desses países muito se deu acerca do incentivo estatal à indústria, servindo como uma espécie de “adubo” para o seu crescimento.
  • Além do mais, essa política de subsídios também contribuiu para o uso indiscriminado dos agrotóxicos, que passaram a ser utilizados, não só pelos agricultores mais bem capitalizados, mas também por produtores familiares compelidos e impulsionados a adquirir esse “pacote tecnológico”, de uma forma passiva. Como resultado, observa-se um grande desrespeito às prescrições técnicas e um uso de práticas agrícolas totalmente descuidadas, que sobre expõem os agricultores e trabalhadores aos riscos inerentes dessa opção tecnológica.
Já, a partir da década de 80, o surgimento de novas tecnologias trouxe um novo impulso à agricultura brasileira, ao proporcionar a produção em áreas até então pouco exploradas e com baixa fertilidade do solo, como é o caso do cerrado brasileiro. Somando-se a isso, as técnicas do plantio direto deram maior aproveitamento a áreas produzidas; no entanto, exigiam um maior uso dos herbicidas, que tiveram um crescimento de 540% entre 1978 e 1998 (Pronaf, 2005). 
  • O cerrado brasileiro passou a se tornar a nova fronteira agrícola e, hoje, os incrementos de área se concentram predominantemente em Estados que compõem esse bioma. Além da cana-de-açúcar, café e da laranja, a agricultura brasileira se especializou no cultivo de grãos. Atualmente, os grãos representam a principal parcela na produção brasileira, com destaque para a produção de milho e de soja. 
Em meados dos anos 80, a soja se transformou no produto de grande interesse nacional, face à demanda mundial, capaz de proporcionar ganhos comerciais expressivos, sobretudo em relação à geração de divisas em pleno período de substituição de importações. Tal fato se intensificou nos anos 90 e, na década atual, a soja representa 36% da área plantada e um volume de uso de agrotóxicos de 50% do total de vendas desses insumos em 2005, contra 11% do milho, em uma área que equivale 18% do total plantado no país (SINDAG, 2005).
  • Verifica-se, de 1975 até meados da década de 80, uma associação das curvas de crédito rural com a de consumo de agrotóxicos e, nos cinco primeiros anos da década de 80, a redução do crédito rural impactou sobremaneira o consumo desses insumos no país. 
Somente a partir da década de 90, observa-se um descolamento da curva de consumo de agrotóxico da curva de crédito rural, sendo esse crescimento liderado pelos herbicidas. No inicio dos anos 90, o Brasil já era o quinto mercado mundial, sendo que em 1994 e em 1998 atingiu a quarta e terceira posição, respectivamente, apenas superado pelos EUA e Japão.
  • Segundo Martins (2000), foram várias as razões para o crescimento deste segmento industrial na década de 90 sem o apoio do crédito Estatal: a estabilidade da moeda, a securitização das dívidas, os preços dos produtos agrícolas elevaram a renda do produtor, a “grande quebra” da safra americana em 1994, o marketing ‘agressivo’ e financiamentos realizados pelas próprias empresas produtoras dos agrotóxicos. 
Em relação a esse último item, a escassez de crédito fez com que as empresas agroquímicas entrassem de forma maciça no financiamento à aquisição de insumos, com prazos, em geral, iguais aos do período de safra, o que possibilitou uma mudança na agricultura brasileira no que diz respeito à dependência da oferta de crédito rural por parte do governo. 
  • Apenas nos últimos anos verifica-se uma expansão com linhas específicas para incentivo à modernização de bens de capital, como a compra de tratores e colheitadeiras (MODERFROTA), e o programa de agricultura familiar, através do PRONAF.
Apesar de se observar um crescimento exponencial do consumo de agrotóxicos nos últimos anos, as perspectivas da indústria em médio e longo prazo parecem ser ainda maiores. Segundo o sindicato dos fabricantes de agrotóxicos (SINDAG), o Brasil possui um elevado potencial de consumo de agrotóxico devido a dois fatores: a baixa quantidade consumida desses produtos por hectare em áreas cultivadas; grande área agriculturável a ser incorporada à produção agrícola. 
  • Em 2003, quando ocupava a segunda posição no ranking de maior mercado consumidor, o Brasil se encontrava na 8ª posição no consumo quilo/hectare de ingrediente ativo (3,2 kg/ha), atrás de paises como a Holanda e a Bélgica, ambos primeiro e segundo colocado com consumo de 17,5 kg/ha e 10,7 kg/ha, respectivamente (SINDAG, 2003). 
Já em relação ao potencial de crescimento de área, projeções feitas pelo Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) revelam que a área agriculturável no país poderia crescer 170 milhões de hectares, ou seja, 193% a mais que os atuais 58 milhões de hectares, tudo, via reduções na área destinada à pecuária e, principalmente, pelo o avanço da fronteira agrícola (Schlesinger, 2006). Em 2008, o Brasil tornou-se o principal mercado consumidor de agrotóxicos, ficando à frente dos EUA, consumindo 733,9 milhões de toneladas (Sindag, 2009). 
  • Esse volume pode ser considerado como um verdadeiro “tsunami” na agricultura brasileira, mas que os danos à saúde e, conseqüentemente, os sócio-econômicos ainda se encontram “invisíveis” perante a sociedade em geral.

Uso dos Agrotóxicos e Seus Impactos à Saúde e ao Ambiente

Agrotóxicos e seus impactos à saúde:
  • Os agrotóxicos já trouxeram benefícios à saúde, principalmente nas décadas de 50 e 60, quando se combateram em diversos países epidemias causadas por doenças tropicais, como, por exemplo, a campanha mundial de saúde publica de 1955 na tentativa de erradicação da malária. Segundo Bull & Hathaway (1996), estima-se que, até 1970, algo em torno de 2 bilhões de casos de malária tenham sido prevenidos pela campanha da OMS, salvando cerca de 15 milhões de vidas.
Todavia, o despertar para o reconhecimento dos efeitos nocivos desses produtos se deu a partir de 1962, com a obra “Primavera Silenciosa”, de Rachel Carson, que trouxe à tona os efeitos adversos da utilização dos pesticidas e inseticidas químicos sintéticos, particularmente sobre o uso do DDT: 
I) penetrava na cadeia alimentar e acumulava-se nos tecidos gordurosos dos animais, inclusive do homem, aumentando o risco de causar câncer e danos genéticos;
II) não só atingia as pragas, mas um número incontável de outras espécies, silenciando pássaros, peixes, até mesmo crianças;
III) Permanecia tóxico no ambiente mesmo com sua diluição pela chuva, sendo que as espécies contaminadas poderiam migrar para outros ambientes, levando os possíveis riscos de contaminação para alvos bem mais distantes que sua origem.
Pode-se dizer que esse estudo foi um marco na desmistificação do milagre da ciência em prol da agricultura, pois transferiu o debate restrito à academia para a sociedade em geral, iniciando um processo que culminou na necessidade de controle e regulação desses produtos, bem como a fabricação de substâncias menos agressivas ao homem e ao seu meio ambiente. Isso ficou claro com o passar dos anos, com o surgimento de vários problemas ambientais e de saúde associados ao uso dos agrotóxicos, o que acabou concorrendo para o protocolo de Estocolmo (2001), assinado por cerca de 120 países, que proibia ou restringia não só o DDT, mas de outras substâncias potencialmente poluentes. 
  • Os chamados de Persistent Organic Pollutants (POPs), cuja lista se resumia a doze substâncias altamente persistentes e tóxicas: Aldrin, Clordano, DDT, Dieldrin, Dioxinas, Eldrin, Furanos, Heptacloro, Hexaclorobenzeno (HCB), Mirex, Bifenilas policloradas (PCBs) e Toxafeno. As Dioxinas, PCBs, HCB, Furanos são compostos altamente cancerígenos e, em geral, são altamente estáveis, podendo persistir no ambiente por até 30 anos, como é o caso do DDT (OPS, 1996). 
Mesmo assim, durante um bom período, muitos países desenvolvidos, apesar de proibirem tais substâncias em âmbito doméstico, passaram a exportar ou até mesmo migrar suas plantas produtivas para países com maior fragilidade institucional e baixo controle de poluentes (Porto et. al, 2010). Por exemplo, em cerca de mil locais em 49 países da África e do Oriente Médio, um estudo relatou que estoques de pesticidas indesejados ou proibidos perfaziam um total de mais de 16.500 toneladas (FAO, 1995a). 
  • Segundo Porto et. al (2010, apud Barrios, 1994, Colopy, 1994), um dos motivos que acabou culminando na Convenção de Estocolmo foi o fato de que os países industrializados perceberam que estavam produzindo o “ciclo do veneno”, uma vez que, em função da alta persistência desses agrotóxicos, o veneno retornava para esses países sob a forma de alimentos contaminados. Após uma série de restrições aos clorados, uma segunda geração de agrotóxicos, bem menos persistentes no meio ambiente, foi colocada em circulação: os organofosforados e carbamatos. 
Por outro lado, esses produtos são mais tóxicos aos vertebrados devido a sua grande ação neurotóxica. Em geral, são inibidores da enzima acetilcolinesterase, que degrada o mediador químico acetilcolina, sendo que a sua ausência levaria ao acúmulo de acetilcolina e o organismo passaria a apresentar uma série de manifestações clínicas, caracterizando um quadro de intoxicação aguda (Soares et al., 2003). Também são frequentes os estudos associando especialmente o uso de agrotóxicos carbamatos com certos tipos de cânceres (Fritschi, 2005; Kamanyire & Karalliedde, 2004).
  • Em meados da década de 70 foram introduzidos no mercado os piretróides, que são inseticidas normalmente mais eficientes, pois necessitam de uma menor quantidade do produto ativo, o que os torna menos suscetíveis a contaminação. 
Por outro lado, são em geral mais caros que os organofosforados e, embora menos tóxicos do ponto de vista agudo, são irritantes para os olhos e mucosas, causando tanto alergias de pele como crises de asma brônquica (Couto, 2004). Em relação aos herbicidas, destaca-se o uso do 2,4 D e 2,4,5 T, compostos cuja combinação era utilizada na guerra do Vietnã na abertura de clareiras na selva, os chamados “agentes laranjas”. 
  • Segundo Peres & Moreira (2003), esses compostos seriam promotores da carcinogênese em seres humanos. Também o uso em longo prazo de produtos como 2,4 D podem levar à formação de pterígio, uma fina membrana que cobre a córnea, diminuindo a atividade visual, sendo o tratamento para sua remoção, na maior parte das vezes, cirúrgico (Pingali et al., 1994). Já em relação aos fungicidas, os ditiocarbamatos podem determinar parkinsonismo pela ação no sistema nervoso central e, nos casos de exposição intensa, provocam dermatite, faringite, bronquite e conjuntivite (OPAS, 1996).
São inúmeros os estudos que associam o uso de agrotóxicos e seus efeitos nocivos na saúde humana (Alavanja et al., 2004; Colosso et al., 2003; Peres et al., 2003; Santos, 2003). Os efeitos agudos aparecem durante ou após o contato da pessoa com o agrotóxico, podendo ser divididos em efeitos muscarínicos (brandicardia, miose, espasmos intestinais e brônquicos, estimulação das glândulas salivares e lacrimais); nicotínicos (fibrilações musculares e convulsões); e centrais (sonolência, letargia, fadiga, cefaléia, perda de concentração, confusão mental e problemas cardiovasculares) (Mariconi, 1986). 
  • Um valioso indicador da relação entre exposição a agrotóxicos fosforados e carbamatos e a intoxicação aguda é o nível da enzima colinesterase no sangue e são muitos os trabalhos que estudam essa associação (Oliveira-Silva et al, 2000; Etges et al. 2002; Moreira, 2002, Salvi 2003; Soares et al. 2003).  Nesses estudos, a prevalência de intoxicação encontrada em trabalhadores rurais por meio do exame de colinesterase plasmática (BchE) variou entre 2,5% e 14%.
De acordo com Lyznicki et al. (1997), os efeitos dos agrotóxicos na saúde humana, especialmente os crônicos, não têm sido caracterizados adequadamente, pois os efeitos tardios de alguns desses químicos podem se tornar aparentes após anos de exposição. 
  • Apesar dessa dificuldade, a literatura médica fornece um conjunto de indicadores que relacionam os efeitos na saúde devidos à exposição em longo prazo aos agrotóxicos. Problemas oculares, no sistema respiratório, cardiovascular, neurológico, assim como efeitos cutâneos e problemas gastrointestinais, podem estar relacionados ao uso desses produtos (Pingali et al., 1994).
Segundo Koifman & Hatagima (2003) um grande número de agrotóxicos apresenta atividade potencialmente capaz de desregular o equilíbrio endócrino de seres humanos e animais, sendo que a exposição a esses disruptores endócrinos estaria associada a cânceres, a modificação na razão entre sexos ao nascimento, infertilidade, más-formações congênitas no trato genital masculino e a modificações na qualidade do sêmen. 
  • São comuns os estudos na literatura que revelam sobre risco às neoplasias de pâncreas e tumores hematológicos em indivíduos expostos a alguns tipos de agrotóxicos (Ji et al. (2001), Alguacil et l. (2000)).
Alavanja et al. (2002), estudaram a associação entre 45 agrotóxicos e a incidência de câncer de próstata em uma coorte retrospectiva de 55.332 aplicadores de agrotóxicos na Carolina do Norte (EUA). Encontrou-se uma associação entre o uso de inseticidas clorados entre agricultores com mais de 50 anos e o câncer de próstata, sendo que a de incidência padronizada para câncer de próstata foi de 1,14 (IC 95%: 1,05-1,24). 
  • Em outra coorte com 694 casos e 694 controles em dois estados da Austrália, Fritschi (2005), procurou-se encontrar associações entre o uso de agrotóxicos e a presença de linfomas de não-Hodgkin. Controlando fatores como idade, sexo, residência e etnia, os autores encontraram uma odds ratio de 3,09 para indivíduos expostos a algum tipo de agrotóxico, sendo que inseticidas organoclorados, fosforados e outros herbicidas, tiveram risco aumentado quando comparados à exposição do herbicida phenoxy.
Também é comum encontrar na literatura específica estudos com familiares de agricultores, ou seja, indivíduos potencialmente expostos ao ambiente cujo agrotóxico é aplicado. Kirrane et al. (2005), estudando uma coorte na Carolina do Norte (EUA), encontrou um risco elevado de degeneração na retina em mulheres de aplicadores de agrotóxicos que utilizam fungicidas maneb, mancozeb e ziram (odds ratio de 1,8, ajustados por idade e local de residência). 
  • Alem do mais, muitos agrotóxicos são excretados por meio do leite materno, o que os torna também uma fonte de contaminação para os recém-nascidos. Segundo Mills & Zahm (2001, apud Koifman & Hatagima, 2003), a exposição aos agrotóxicos durante a infância é objeto de diversos estudos que têm revelado associação com tumores hematológicos e de cérebro, sendo os riscos mais elevados que os encontrados em adultos, o que sugere uma maior suscetibilidade aos agrotóxicos na infância.
Sharpe at al. (1995) investigou as possíveis causas da elevada incidência de Tumor de Wilms (TW) encontradas em uma pesquisa em Minas Gerais, no período de 1987 a 1989, com familiares de 109 crianças com TW e outros 218 controles. 
  • Pais, com a mesma renda e educação, quando trabalhadores agrícolas expostos a inseticidas, tiveram odds ratio de 3,9 (IC 95%: 1,3-11,1) quando comparados aos pais não trabalhadores agrícolas. Quando comparados aos trabalhadores agrícolas sem exposição a agrotóxicos, esse número foi de 1,3 (IC 95%: 0,6-2,7). Já, as mães trabalhadoras agrícolas expostas a agrotóxicos, tiveram um risco aumentado em 3 vezes (IC 95%: 0,9- 10,9) quando ajustado à renda e à educação.Verificam-se tendências muito similares, com um incremento acelerado na produtividade a partir de 1990 e um aumento exponencial das intoxicações por agrotóxicos. 
As séries históricas podem sugerir uma associação entre aumento de produtividade e a intoxicação, além de apontar para uma questão importante: a da existência de um trade-off entre essas duas variáveis, o que significa que, no atual modelo de produção baseado no uso intensivo desses insumos, ou priorizamos a boa saúde ou os ganhos de produtividade. As pesquisas tendem a revelar que as duas coisas em conjunto se mostram incompatíveis.
  • Esses dados evidenciam que, da mesma forma em que a revolução verde gerou resultados positivos para a agricultura mundial, trouxe também passivos que traduzidos em números são a cada ano, no mundo, pelo menos um milhão de pessoas intoxicadas por pesticidas e 3.000 a 20.000 destas são levadas a óbito. 
Isso ainda é pior em países em desenvolvimento, onde ocorrem pelo menos metade destas intoxicações e 75% dessas mortes, tendo em vista o nível educacional baixo e poucos cuidados com o uso, assim como a regulamentação e os métodos de controle são frequentemente negligentes ou inexistentes (OPS, 1996). Informações adicionais acerca dos efeitos nocivos à saúde poderão ser encontradas nos artigos que compõem esta tese.

Referencial teórico metodológico e Dados:
  • A presente tese combina diferentes métodos da economia e da estatística que, de forma não exaustiva, são abordados e também referenciados por bibliografias no próprio corpo dos textos, por exemplo: o Ilness Cost Method (COIM); regressão logística e multinível, análise de componentes principais (ACP); bem como conceitos teóricos vindos da própria economia, ecologia e da toxicologia. 
No entanto, uma perspectiva mais macro acerca da metodologia pode-se estender a compreensão para além dos métodos utilizados nos artigos, ampliando o escopo das análises e desenvolvendo estratégias de produção, integração e aplicação de conhecimentos que contextualizem os problemas, proporcionando um diálogo mais amplo com os diferentes atores envolvidos. Tal proposta é chamada avaliação integrada (Integrated Assessment - IA) e se encontra no centro de vários esforços conceituais e metodológicos.
  • Segundo Porto (2007), uma avaliação integrada pode ser definida como “um processo interdisciplinar de articular, interpretar e comunicar o conhecimento de disciplinas científicas diversas em torno de um problema, de tal modo que sua cadeia global de causa-efeito possa ser avaliada a partir de uma perspectiva holística ou sinóptica”. 
Em estudos que utilizam um referencial teórico metodológico do tipo IA, usados basicamente para lidar com problemas complexos com múltiplas e irredutíveis dimensões, dois produtos são básicos na perspectiva dos resultados: 
I) gerar um valor adicional para a compreensão quando comparado com avaliações disciplinares restritas;
II) prover informação útil aos que tomam decisões, facilitando dessa forma a definição e implementação de políticas e estratégias. (NUSAP, 2002).
A avaliação integrada proposta neste trabalho reconhece como fundamental a produção de conhecimentos tácitos a partir de experiências locais e empíricas, envolvendo os diversos grupos com interesses legítimos. No caso dos agrotóxicos, ao menos quatro campos de conhecimento são envolvidos nas análises aqui implementadas: a economia, a saúde pública (em especial a saúde ambiental), a ecologia e a agricultura. 
  • No entanto, existem interesses difusos entre os mesmos, principalmente, por parte da agricultura “moderna”, em que o propósito privado e muitas vezes também do Estado acabam não condizendo com a finalidade de geração de bem-estar social, sobretudo quando se faz uso de uma matriz tecnológica que sustenta o uso desses insumos nocivos à saúde e ao ambiente.
Portanto, algumas políticas em prol de uma melhor saúde no campo e na mesa do brasileiro necessariamente envolvem o controle do uso ou eliminação dos agrotóxicos, o que acaba impactando sobremaneira variáveis da agricultura e consequentemente da economia. 
  • Da mesma forma, ações que promovam a geração de conhecimentos e incentivos às bases tecnológicas que incorporam o conceito de sustentabilidade na agricultura são indiretamente políticas aliadas aos interesses nos campos da saúde e do ambiente. Em síntese, a questão dos agrotóxicos é complexa e perpassa todos esses campos de conhecimento. 
No entanto, uma maior convergência de interesses somente tornar-se-á possível a partir da geração de incentivos a outras propostas de agricultura apoiadas em princípios da sustentabilidade, saúde e justiça social.
  • Essas mudanças não envolvem somente ações de curto prazo, mas sim transformações estruturais nas relações comerciais, econômicas e de poder, e também na própria ciência, na tecnologia e nas instituições. Essa busca exigirá uma nova ciência da sustentabilidade que incorpore e integre várias dimensões, e, portanto, a proposta de implementar análises integradas e contextualizadas na questão dos agrotóxicos faz parte de um esforço maior de transformação de longo prazo (Porto, 2007). 
No entanto, mesmo sendo um processo contínuo e não imediato, tais resultados poderiam ser abreviados se ações facilitadoras fossem pautadas nas esferas das políticas públicas.
  • Na análise integrada conduzida nesta tese elegeu basicamente a economia como um elemento demarcador dessas fronteiras de conhecimento, ao se pensar o uso dos instrumentos econômicos de políticas públicas como canais de integração e convergência dos diferentes interesses dos atores envolvidos, sejam agricultores, o Estado e a sociedade em geral. 
Nesse caso, tanto a saúde pública, ao reconhecer os custos decorrentes do efeito da contaminação às populações expostas – em especial os trabalhadores rurais - como as políticas agrícolas que incentivem a produção sustentável, além de outras nos campos do meio ambiente, da educação, da ciência e tecnologia, dentre outras, podem influenciar a regulação do uso dessas substancias no processo produtivo a partir da utilização desses instrumentos econômicos.
  • Em síntese, o problema da fragmentação das várias visões analíticas, que todavia se distancia dessa proposta metodológica, pode ser ilustrado pela parábola do elefante no escuro, cuja versão a seguir foi adaptada do livro de Idries Shah (1976):
Um dia um circo chegou a uma cidade onde várias e curiosas pessoas nunca haviam visto um elefante anteriormente. Impacientes, um grupo de corajosos mais afoitos decidiu não esperar pelo dia da estreia e resolveu entrar na jaula do elefante à noite. Sem acenderem lanternas para não chamar a atenção, os “pesquisadores” passaram a tocar em várias partes do seu corpo. Sem demorarem muito, com receio de serem pegos, eles saíram da jaula e foram para a praça pública relatar aos vários outros curiosos o que haviam descoberto.
“O elefante é como um enorme tronco de árvore”, disse aquele que encostou na perna. “Nada disso, ele se parece com uma lesma gigante que aspira o ar com dois buracos na extremidade”, falou o outro que encostou na tromba. “Vocês devem estar loucos”, exclamou o terceiro, “o elefante parece uma cobrinha que balança de um lado para o outro, sem contudo sair do lugar.”
E assim os depoimentos foram se sucedendo, cada qual diferente do outro. Ao final ninguém conseguiu “entender” o que era um elefante, embora cada um dos relatores jurasse estar expondo a sua “verdade”, pois estavam baseadas em experiências empíricas reais. E o mistério foi resolvido apenas no dia em que o circo se apresentou. (In Porto, 2007, pag. 199 e 205 +-) Na verdade, esta tese não dá conta e tampouco tem a pretensão de “olhar a totalidade” dos problemas dos agrotóxicos. 
  • Espera-se, entretanto, que a parcela do problema trabalhada na tese possa revelar elementos importantes e ajudem a desvendar alguns pontos dessa questão de elevada complexidade. 
Segundo Porto (2007), uma análise integrada atinge um ponto mais maduro, ainda que inacabado, quando produzem documentos ou materiais informativos mais substanciais e completos sobre o problema, com uma agenda clara de ações de curto, médio e longo prazo. Portanto, é grande o esforço de pesquisa para atingir esse objetivo e este trabalho contribui nessa direção. No que diz respeito aos dados, quatro bases do IBGE foram utilizadas nos artigos desta tese: 
I) a Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC 2002): Suplemento de Meio Ambiente;
II) a Pesquisa de Previsão de Safras do Paraná (PREVS 99);
III) Pesquisa de Consumo Sustentável (PECOS/CDHP 2008);
IV) e o Censo Agropecuário (2006). 
Em todas essas fontes de informação, foram utilizados os arquivos de micro dados. Embora, cada uma dessas bases possua uma seção descritiva dentro do respectivo artigo, informações complementares se fazem necessárias em função da restrição ao tamanho dos capítulos redigidos sob a forma de artigos. 
  • A MUNIC tem como principal objetivo produzir informações relativas às administrações locais e, no ano de 2002, pela primeira vez, trouxe informações ambientais de 5560 municípios brasileiros instalados até 31 de dezembro de 2001. 
A estrutura do questionário de meio ambiente segue o modelo desenvolvido pelas Nações Unidas, baseado na abordagem pressão-estado-resposta (PER), permitindo identificar as pressões antrópicas ao ambiente, retratar o seu estado atual e, por último, identificar os esforços pró-ativos dos governos municipais em ações ambientais (IBGE, 2002). 
  • A unidade de investigação da MUNIC foi o município, sendo o informante principal a prefeitura, através dos diversos setores que a compõem. No caso das informações ambientais, o responsável foi a secretaria de meio ambiente ou órgão similar responsável por essas questões, desde que sua gestão fosse municipal.
A PREVS é inspirada nas pesquisas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) com base nos grandes painéis de amostras de áreas, estratificadas segundo o uso do solo: áreas de cultivos intensivos, áreas de mata, pastagens e áreas não agrícolas (FAO, 1998). A pesquisa teve o seu inicio na safra de 1986/87 e se estendeu até a safra de 1999/2000, ano em que trouxe informações suplementares e inéditas atinentes ao uso de agrotóxico no estado do Paraná. 
  • As unidades de amostragem da pesquisa são os segmentos de área; neste ano, foram amostrados 430, selecionados de forma sistemática em única etapa, com igual probabilidade e sem substituição. Por sua vez, os segmentos de área são agregações de estabelecimentos ou áreas de exploração agrícola, onde as informações da pesquisa são coletadas. 
Na pesquisa em questão foram entrevistados 1637 estabelecimentos rurais ou áreas de exploração, representando cerca de 0,42% da área total do Estado. Por exemplo, a pesquisa de 1999 estimou 382.998 estabelecimentos agropecuários no estado do Paraná, com um erro de até 5%, o que representa uma ótima estimativa. 
  • Os dados dos Censos Agropecuários de 1995/96 e 2006 computaram, respectivamente, para o Estado, 369,8 mil e 371,1 mil estabelecimentos agropecuários, número próximo ao estimado pela PREVS. Maiores detalhes sobre a metodologia da pesquisa pode ser encontrado em “Uso de Agrotóxicos no Estado do Paraná” (IBGE, 2001).
Antes de apresentar a próxima base de dados utilizada, é preciso ressaltar a importância desse tipo de iniciativas como a PREVS para estudos dos agrotóxicos e seus impactos. Há um consenso dos especialistas em saúde pública que lidam com a questão dos agrotóxicos de que os dados sobre intoxicações, não só no Brasil, sofrem de subnotificaçao, e são várias as razões para se levantar essa questão (Peres et al., 2001; Faria et. al., 2004; Oliveira-Silva & Meyer, 2003; Faria, et al., 2007, Oliveira et al., 2003). 
  • No Brasil, as intoxicações agudas de agrotóxicos são registradas em cinco sistemas oficiais de informações em saúde: a Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT/MTE); o Sistema de Informação de Mortalidade (SIM/MS); o Sistema de Internação Hospitalar (SIH/MS); o Sistema Nacional de Informação Tóxico Farmacológica (Sinitox/FIOCRUZ); e o Sistema Nacional de Informação de Agravos Notificáveis (Sinan/MS). Uma característica em comum desses registros administrativos é o fato de não serem comunicáveis entre si, isto é, uma internação no AIH, por exemplo, não necessariamente está computada no Sinitox, na CAT, no Sinan e vice-versa.
Sendo assim, independentemente da natureza da informação, se oficial ou não, todas as iniciativas tanto de inquéritos quanto de estudos de casos pontuais são extremamente relevantes para se conhecer as especificidades locais da intoxicação e subsidiar os formuladores de políticas públicas das diferentes esferas governamentais, sejam municipais, estaduais ou federais.
  • Ao incorporar informações sobre a intoxicação de trabalhadores nos questionários aplicados aos estabelecimentos rurais, a PREVS e, recentemente, o Censo Agropecuário de 2006 permitem estabelecer associações entre as mais diferentes variáveis da unidade produtora. 
Apesar de serem informações baseadas em autodeclarações, e sofrerem de vieses como o do entrevistado, a vantagem desses inquéritos sobre os registros administrativos é a possibilidade de levar em conta ou de se controlar os efeitos associados à atividade agrícola, bem como a forma com que são empregados os agrotóxicos nos estabelecimentos rurais. 
  • Pesquisas que vão ao nível da propriedade rural são informações relevantes no esforço de se mensurar o risco dessas atividades produtivas, orientando políticas de mitigação, ao mesmo tempo reconhecendo outras formas produtivas de elevada eficiência socioeconômica.
A PECOS foi uma pesquisa desenvolvida pelo Curso de Desenvolvimento de Habilidades em Pesquisa (CDHP), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, baseado no Survey Skills Development Course, do Instituto de estatística do Canadá, que se propõe a fornecer aos participantes uma visão abrangente de todo o processo de planejamento e execução de uma pesquisa domiciliar por amostragem. 
  • No ano de 2008, o CDHP foi a campo com a pesquisa domiciliar sobre "Atitudes e Hábitos de Consumo Sustentável - PECOS", cuja amostra entrevistou 1517 moradores, residentes em 700 unidades domiciliares nos bairros de Botafogo e Humaitá, na cidade do Rio de Janeiro (ENCE/IBGE, 2008).
O Censo Agropecuário cobriu todo território nacional coletando informações de 5.175.489 estabelecimentos rurais. Essas informações estão em consonância com as recomendações e os conceitos básicos consagrados pela Food and Agriculture Organization of the United Nation (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação) e trazem um verdadeiro retrato da agricultura brasileira. Os dados foram divulgados em setembro de 2009 e ainda podem sofrer alguns ajustes. 
  • Embora traga informações sobre intoxicações nos estabelecimentos, esta tese priorizou o uso do censo a partir de variáveis que caracterizam a produção proveniente da agricultura orgânica, em razão do pouco período de processamento dos dados. 
Além do mais, o uso de variáveis como a área plantada das culturas foi evitado em função de reavaliações que estão atualmente em curso no IBGE.

Uso dos Agrotóxicos e Seus Impactos à Saúde e ao Ambiente