segunda-feira, 7 de março de 2016

Estudos para uma sociedade sustentável

Desenvolvimento e Natureza: Estudos para uma sociedade sustentável

Clóvis Cavalcanti (Org.)
  • Expressão surgida no contexto das discussões sobre o desenvolvimento sustentável, economia da sustentabilidade pode soar a muitos como esotérica; a outros, como mais uma adição ao rol de termos inacessíveis aos leigos; a outros mais, como uma expressão do modismo desencadeado pela ênfase sobre o verde ; a outros ainda, como uma inovação vocabular de estética discutível. Talvez ela seja tudo isso, mas seu sentido é claro. 
Trata-se de uma preocupação justificada com o processo econômico na sua perspectiva de fenômeno de dimensão irrecorrivelmente ecológica, sujeito a condicionamentos ditados pelas leis fixas da natureza, da biosfera. 
  • É uma forma de exprimir a noção de desenvolvimento econômico como fenômeno cercado por certas limitações físicas que ao homem não é dado elidir. Isto equivale a dizer que existe uma combinação suportável de recursos para realização do processo econômico, a qual pressupõe que os ecossistemas operam dentro de uma amplitude capaz de conciliar condições econômicas e ambientais. 
Em outras palavras, não se pode aceitar que a lógica do desenvolvimento da economia entre em conflito com a que governa a evolução da biosfera, tal como tem ocorrido na experiência dos últimos cinqüenta anos o que induziu o físico Henry Kendall (prêmio Nobel de Física), do MIT, a afirmar que os seres humanos e o mundo natural estão numa rota de colisão (ISEE, 1994). 
  • Ao se falar de rota de colisão entre homem e natureza, não se está pregando catastrofismo. Muito ao contrário, realçar a noção de uma economia da sustentabilidade diz respeito ao fato de que as funções ecossistêmicas são parâmetros que não se podem modificar impunemente, necessitando de estabilidade diante de perturbações suscitadas pelas ações do homem. 
A natureza, como se sabe, orienta-se pelo princípio da homeostase (Branco, 1989), o que garante a capacidade dinâmica dos ecossistemas de consertarem seus desvios do equilíbrio mediante processos naturais preservadores da complexa rede de ciclos biogeoquímicos que sustentam a vida no planeta. 
  • Assim, necessita-se de uma análise multidimensional, multidisciplinar, que dê conta, no processo econômico, das referências físicas biológicas, geológicas, químicas dentro do que se encaixam as estruturas da economia. Essa é a essência do esforço intelectual que tem dado forma à disciplina de economia da sustentabilidade ou economia ecológica. 
Subjacente às idéias a esta ligadas encontra-se o senso de responsabilidade que as presentes gerações devem ter relativamente às futuras, o que obriga o cientista a pesquisar de que maneira o uso dos recursos à disposição do homem deve ser feito para se preservar a capacidade de sustentação do ecossistema. 
  • Trata-se de deslocar a ênfase no crescimento contínuo da economia para o compromisso com a preservação do meio ambiente, esforço que tem levado a proposições de um tipo de sistema econômico ajustado às condições determinadas pela base física em que está apoiado, como é o caso da economia do Estado firme ou estável (steady-state economy, em inglês, às vezes também chamada de economia do Estado estacionário, o que não é exatamente a idéia do conceito) (Daly, 1980). 
A economia não pode ser vista como um sistema dissociado do mundo da natureza, pois não existe atividade humana sem água, fotossíntese ou ação microbiana no solo. A comparação, nesse contexto, do sistema econômico com um mecanismo não é das mais felizes, pois isto lhe retira o sentido da irreversibilidade própria das mudanças qualitativas que o processo econômico desencadeia (Georgescu-Roegen, 1974) e o afasta de sua dimensão ecológica. Introduzindo-se a coordenada de sustentação da vida como parte da exploração dos recursos da natureza pelo homem, a economia da sustentabilidade remete à formulação de princípios que impeçam a seqüência sugerida pela identificação de um conflito que se agrava entre o homem e a natureza (a rota de colisão de Kendall). 
  • Ora, como a natureza é inflexível nos seus parâmetros básicos e o ecossistema não cresce afinal, pela primeira lei da termodinâmica, matéria e energia não são criadas, uma troca sustentável entre a sociedade e o meio ambiente envolve alguma forma de restrição das atividades societais (Eriksson, 1992). Ou seja, não se pode extrapolar aquilo que um economista chamaria de curva de transformação ou de possibilidades de produção da natureza.
A economia da sustentabilidade, assim, implica consideração do requisito de que os conceitos e métodos usados na ciência econômica devem levar em conta as restrições que a dimensão ambiental impõe à sociedade. Do mesmo modo, a sociedade deve estar de tal modo organizada que sua troca de matéria e energia com a natureza não viole certos postulados. 
  • Na visão desenvolvimentista tradicional, a natureza se percebe como uma cornucópia fornecedora inexaurível de recursos e, ao mesmo tempo, como um esgoto de infinita capacidade de absorção de dejetos. Tal visão de um fluxo entre dois infinitos, o que implica que sua vazão possa crescer ilimitadamente (Lutzemberger, 1984) é incompatível com o modelo dos ciclos de materiais do ecossistema, regidos pela bússola da homeostase e por predicados frugais. 
A moderna sociedade industrial se caracteriza, por sua vez, por fluxos de sentido único, em que matéria e energia de baixa entropia se convertem continuamente em matéria e energia de alta entropia, não integrados nos ciclos materiais da natureza. Não se pode ter sustentabilidade dessa forma. Um modelo sustentável tem que se basear em fluxos que sejam fechados dentro da sociedade ou ajustados aos ciclos naturais (Eriksson, 1992). Este é um desafio ponderável para a compreensão científica das relações entre o homem e seu referencial ecológico, entre sociedade e natureza.
  • O mundo atual, apesar do reconhecimento da importância do conceito de desenvolvimento sustentável, que levou à Conferência Rio-92, caminha concretamente por rumos que desafiam qualquer noção de sustentabilidade. Não é possível, por exemplo, aceitar projeções de taxas de crescimento da economia que supõem um ritmo anual de aumento do PIB de, digamos, 8% ao ano. Seguir nessa suposição equivaleria a admitir, por exemplo, que a economia brasileira, em 32 anos, atingiria a dimensão atual da economia americana. 
Isso pode ser desejável de um ponto de vista puramente quantitativo (será mesmo?), mas é irrealizável como meta de longo prazo consistente. Pensar que a economia chinesa possa crescer a mais de 10% a.a., sustentavelmente, por mais uma década, é sonhar acordado. São evidentes em toda parte que os caminhos trilhados estão esbarrando em barreiras intransponíveis. Entre 1975 e 1990, por exemplo, o PIB global cresceu de 56% em termos reais, mas o emprego subiu apenas de 28% (prevê-se que as tendências continuarão nesse tom nos próximos anos) (PNUD, 1993). 
  • Cálculos para o Brasil dão conta de que, nas quinhentas maiores empresas do país, cada novo posto de emprego custa um investimento adicional de 97 mil dólares, enquanto no mesmo segmento empresarial dos Estados Unidos o valor é de 231 mil dólares (Melhores e Maiores, Exame, edição anual, 1994). 
São duas cifras que denotam a impotência do desenvolvimento em satisfazer necessidades sociais mínimas. Tudo isso sinaliza para uma inevitável crise de insustentabilidade ecológica e social, que se arma nos diversos cantos do planeta. Com tais preocupações em mente é que se convocou um encontro de trabalho (workshop) em Pernambuco, em setembro de 1994, sob a égide da Fundação Joaquim Nabuco, para discutir 
  • A Economia da Sustentabilidade: Princípios, Desafios, Aplicações como se intitulou o evento. Para ele foram convidados os pesquisadores e estudiosos que, de várias perspectivas disciplinares e diversas posições teórico-doutrinárias, trabalham hoje no Brasil sobre a temática proposta. A motivação para tanto foi um evento semelhante, em setembro de 1993, em São Paulo, organizado pelo Projeto Eco-Eco, 
Economia Ecológica para o Desenvolvimento Equitativo, sob a coordenação de Peter H. May, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, onde se discutiu de forma sistemática, no Brasil, pela primeira vez, o sentido e a aplicabilidade de conceitos da economia ecológica. Querendo aprofundar tal discussão é que se chegou ao encontro de setembro de 1994 na Fundação Joaquim Nabuco, de que os trabalhos reunidos neste livro são contribuições. 
  • Na verdade, não se trata de todas as contribuições apresentadas no workshop, mas das que estavam em versão mais definitiva e em condições de publicação. Assim, este livro não é um volume de anais, mas de papers escritos em torno de um mesmo foco de investigação, seja no plano mais teórico, seja no de aplicações de conceitos relativos à busca de sustentabilidade no uso dos recursos da natureza. 
É conveniente assinalar como, a despeito do grande interesse que parece despertar a questão ambiental e das referências que lhe fazem cada vez mais trabalhos de pesquisadores diversos, é ainda muito reduzida a produção científica sobre a matéria. Basta ver, por exemplo, como na 45ª Reunião Anual da SBPC, no Recife, em julho de 1993 um evento de grandes proporções, com 8 mil inscritos, de um total de 742 atividades listadas no programa oficial da reunião, apenas seis estavam de alguma forma ligadas à economia da sustentabilidade. 
  • Situação ainda mais constrangedora a esse respeito é a constatação de que, no XVII Encontro Anual da ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais), em Caxambu, MG, em outubro de 1993, não havia uma única atividade sequer, das 58 programadas, que se reportasse ao assunto do desenvolvimento sustentável. Há, portanto, uma enorme lacuna a ser preenchida, uma vez que não se pode admitir que a atividade econômica prossiga em sua rota de colisão com a natureza. Algo tem que ser feito para isso no plano da investigação, da troca de informações, da rotina dos pesquisadores. 
Não basta alegremente supor que o mercado e os instrumentos usuais da ciência econômica estabelecida especialmente de sua versão neoclássica, muito apropriada para lidar com questões estáticas de eficiência alocativa, ao lado do progresso técnico, serão capazes de solucionar os impasses de modelos insustentáveis de produção e consumo e do que se convencionou impropriamente chamar de geração de riqueza. 
  • Uma nova filosofia, da humanidade como parte da natureza e sujeita a suas regras, deve substituir a visão corrente, do homem afastado do restante do mundo natural e como seu senhor e dominador. O grande desafio da economia da sustentabilidade é exatamente desenvolver métodos para integrar princípios ecológicos e limites físicos no formalismo dos modelos econômicos prevalecentes, entre tais princípios especial relevo cabendo às leis de conservação de massa e à primeira e segunda leis da termodinâmica (Mansson, 1992:198). 
Levar a cabo o empreendimento de integração de princípios ecológicos e limites físicos no formalismo dos modelos da economia compreende não poucas dificuldades suscitadas pela necessidade de abordagens multidisciplinares, transdisciplinares, holísticas e sistêmicas. Isto, inclusive, dá origem a uma certa heterogeneidade, visível, por exemplo, neste volume, o que pode até configurar, à primeira vista, uma falta de rumo. 
  • Na verdade, não há uma economia da sustentabilidade nem uma única forma de chegar aos predicados de uma vida sustentável. Inexiste tampouco uma teoria única do desenvolvimento ecologicamente equilibrado. O que há é uma multiplicidade de métodos de compreender e investigar a questão. 
No âmbito da ciência econômica, vai-se da análise biofísica, baseada na termodinâmica, de Georgescu-Roegen (1971), à proposta de ecodesenvolvimento, de Ignacy Sachs (1984), passando-se pelas versões neoclássicas da economia do meio ambiente (ver Norgaard, 1985), cada uma das quais com uma lista de seguidores que conferem suas próprias óticas à análise dos tópicos abordados. 
  • É óbvio que, em face de tal configuração do campo de trabalho, existe a necessidade de se interligarem os pesquisadores que a ele se dedicam, levando-os a descobrir seus espaços de interseção e as áreas em que o desenvolvimento científico deve avançar preferencialmente. 
Este é o pano de fundo que permitiu a realização do workshop e a confecção desta obra coletiva, que tem como propósito espalhar os frutos do trabalho que se realiza sob a direção dos pesquisadores que oferecem contribuição ao livro. Os artigos aqui enfeixados compreendem matéria que pode ser agrupada em três segmentos: princípios, desafios e aplicações da economia da sustentabilidade. 
  • É esta a explicação para a divisão do livro em três partes, cada uma abrangendo um desses três segmentos. A primeira parte sobre princípios abre com o trabalho do sociólogo da Universidade Federal do Pará, Franz Josef Brüseke, no qual este disseca o conceito de desenvolvimento sustentável, a partir de várias instâncias de sua formulação como a que se associa à tese dos limites do crescimento, do Clube de Roma, até chegar a uma reflexão sobre alternativas teóricas e práticas do desenvolvimento sustentável. 
Geraldo Mário Rohde, no capítulo seguinte, examina a questão da mudança de paradigma, abordando as contribuições de novos campos de trabalho científico como a ecologia energética (emergia) de H. Odum, a teoria de Gaia etc. para identificar certos princípios científicos para a sustentabilidade. 
  • No seu paper, de conteúdo mais filosófico, o pensador Armando Dias Mendes, do alto de sua experiência universitária, inclusive como economista e presidente do Banco da Amazônia no passado, perquire as inter-relações e implicações resultantes do envolvimento natural do ser humano pela natureza e as influências humanas sobre esta última. 
O trabalho que aparece, a seguir, como Capítulo 5 do livro, de Héctor R. Leis e José Luis D'Amato, trata do ambientalismo nos seus vários sentidos, abordando também as dimensões histórica, ética e dos tipos psicológicos (propostos por Jung) do movimento. 
  • Trata-se de buscar um caminho original no campo vivencial-psicológico para repensar a evolução do ambientalismo como movimento vital. Andri Werner Stahel discute adiante a sustentabilidade da economia capitalista ou a solubilidade do capitalismo na questão ecológica, no dizer de Castoriadis, à luz da importante concepção de Georgescu-Roegen acerca da entropia no processo econômico. 
A contribuição de Henri Acselrad, a seguir, no Capítulo 7, procura mostrar que a noção de externalidade configura o buraco negro do individualismo metodológico que fundamenta a economia neoclássica, evidenciando a incapacidade da última de equacionar as dimensões coletivas e não-mercantis da produção social. 
  • Antônio Ribeiro de Almeida Júnior questiona o fato de que, longe de serem consensuais, as concepções correntes sobre os corpos dos seres vivos e sobre o corpo humano são extremamente variadas. Desse posicionamento ele parte para uma discussão das concepções de corpo que orientam nossas reflexões sobre a natureza e sobre os assuntos humanos. 
O paper de Clóvis Cavalcanti, falando da índole insustentável do moderno desenvolvimento econômico, e considerando-o como fenômeno único na história, levanta algumas questões sobre sustentabilidade, comparando dois paradigmas muito diferentes de relações entre recursos e necessidades humanas: o dos índios da Amazônia e o dos Estados Unidos. 
  • A segunda parte do livro, sobre desafios confrontados pela economia da sustentabilidade, compreende os Capítulos 10 a 17, iniciando-se com uma análise do antropólogo do Museu Goeldi, Darrell A. Posey, em torno de seus estudos acerca dos índios Kayapó. Posey evidencia aspectos da relação dos indígenas com o meio ambiente e mostra efeitos do contato interétnico com os europeus, finalizando por se referir à ameaça que paira sobre os índios da parte de interesses econômicos que olham com olhos de lucro para o patrimônio nativo. 
Ele invoca a questão dos direitos de recursos tradicionais como possibilidade de proteção de sociedades nativas e tradicionais. Maria Lúcia Azevedo Leonardi reflete, a seguir, partindo dos traços característicos das sociedades contemporâneas, sobre alguns aspectos da questão ambiental que exemplifiquem os limites, contradições e complexidade da sociedade global que se está construindo. 
  • Uma revisão de distintas perspectivas teóricas de tratamento dos problemas suscitados pelo confronto entre economia e ecologia, com a proposição de uma economia política da sustentabilidade, enfatizando o caso brasileiro, é oferecida no Capítulo 12, de autoria dos economistas Celso Sekiguchi e Elson Luciano Silva Pires. 
O capítulo seguinte, escrito por Peter H. May, contém um exame das perspectivas de aplicação dos conceitos da economia ecológica às políticas de desenvolvimento, tomando como ponto de partida uma revisão das propostas metodológicas de incorporação de externalidades ambientais na análise de tais políticas. 
  • André Furtado, incursiona no campo de identificação e interpretação das grandes questões tecnológicas e de desenvolvimento, assim como no novo paradigma técnico-econômico, como ameaça à sustentabilidade do desenvolvimento. Ênfase é dada aí ao caso brasileiro. Uma visão de desafios para a economia da sustentabilidade é aportada ao livro por 
Paula Yone Stroh que, examina a discussão de paradigmas metodológicos de formulação das políticas de desenvolvimento e de gestão da qualidade ambiental, apresentando princípios metodológicos de orientação do planejamento ambiental sustentável com base nas referências teórico-conceituais das ciências sociais. 
  • Adiante, Paulo Freire Vieira, associando as dificuldades de entendimento dos problemas ambientais às insuficiências das propostas avançadas nas últimas duas décadas para sua confrontação prática, trata do novo campo de pesquisa científica voltado para a elucidação da questão ambiental e que tem como objeto central os aspectos estruturais e processuais envolvidos nas transformações da ecosfera. 
Sua proposta seria a adoção, no trabalho científico, de uma diretriz preventiva e apta a balizar a concepção e a viabilização política de estratégias com foco nos objetivos simultaneamente sócio econômicos, político-institucionais, culturais e ambientais da evolução planejada dos sistemas ecos sociais. 
  • Vieira conclui com a exemplificação da aquicultura como instrumento do ecodesenvolvimento. No seu texto, Capítulo 17 do livro, Maurício Tolmasquim, retirando lições do trabalho que executa como economista ambientalista, discute conceitos da economia do meio ambiente, tais como valor de opção, análise de custo-benefício com internalização de externalidades ecológicas, avaliação de impactos ambientais etc., para evidenciar suas forças e deficiências. 
Algumas aplicações da economia da sustentabilidade, ainda de forma incipiente, são mostradas na terceira parte do livro. O primeiro capítulo desta parte, décimo oitavo da obra, é um texto didático do engenheiro mecânico Arsênio Oswaldo Sevá Filho e outros, em que, a partir de conceitos físicos e tecnológicos, se efetuam questionamentos de propostas para uma reforma energética e ambiental no Brasil. 
  • Josemar Xavier de Medeiros, numa linha análoga, aborda empiricamente e com elaboração analítica tópicos sobre a produção e utilização do carvão vegetal na siderurgia brasileira, considerando as possibilidades de apropriação dos custos sócio-econômicos e ambientais envolvidos. 
Sua conclusão é de que há necessidade de mecanismos de reinvestimentos compensatórios na área de meio ambiente para se chegar a uma forma sustentável de realização da atividade econômica do emprego do carvão vegetal em usinas siderúrgicas, especialmente em Minas Gerais. Dália Maimon se detém no Capítulo 20 sobre esforços de incorporação, pelas empresas brasileiras, dentre suas responsabilidades internas, das externalidades por elas geradas. 
  • Dália Maimon trata dos chamados eco business e ecoprodutos, sublinhando atitudes que tendem a tomar corpo dentro do setor privado, no plano internacional, como forma de mitigação de efeitos desastrosos de atividades industriais sobre o meio ambiente. Ela termina por indagar até onde o que as empresas dizem fazer é mais retórica, até onde isso representa ação efetiva. 
Fechando o livro, o economista Antônio Rocha Magalhães, partindo de um histórico das recentes políticas voltadas para o desenvolvimento do Nordeste, com destaque no tocante à região semi-árida, elabora cenários regionais, bem como a definição de uma estratégia de gestão de políticas sustentáveis. Trata-se de um esforço concreto de dirigir a ação pública sob a restrição do desenvolvimento sustentável no Nordeste brasileiro.

Referências Bibliográficas:

BRANCO, Samuel M. (1989). Ecossistêmica: uma abordagem integrada dos problemas do meio ambiente. São Paulo, Edgar Blücher.
DALY, Herman E. (1980). Introduction to the steady-state economy. In: DALY, H. E. (org.). Economics, Ecology, Ethics. São Francisco, Freeman, pp. 1-31.
ERIKSSON, Karl-Erik (1992). Physical foundations of ecological economics. In:
HANSSON, Lars O. & JUNGEN, Britta (orgs.). Human responsibility and global change. Anais da International Conference in Göteborg, 9-14 de junho de 1991. Gotemburgo, University of Göteborg, pp. 186-196.
GEORGESCU-ROEGEN, N. (1971). The entropy law and the economic process. Cambridge, Massachusetts, Harvard University Press. (1974).Energy and economic myths. In: BURCH, W. & BORMAN, F. H. (orgs.). Limits to growth: the equilibrium state and human society. São Francisco, Freeman.
ISEE (International Society for Ecological Economics) (1994). Ecosystem health & medicine: integrating science, policy, and management. Newsletter, v. 5, nº 3, julho.
LUTZEMBERGER, José (1984). Prefácio. In: DALY, H. E. A economia do século XXI. Porto Alegre, Mercado Aberto, pp. 7-9.
MANSSON, Bengt A. (1992). Fundamental problems with energy theories of value. In: HANSSON, Lars O. & JUNGEN, Britta (orgs.). Human responsibility and global change. Anais da International Conference in Göteborg, 9-14 de junho de 1991. Gotemburgo, University of Göteborg, pp. 197-206.
NORGAARD, Richard B. (1985). Environmental economics: an evolutionary critique and a plea for pluralism. Journal of Environmental Economics, 12, pp. 382- 393.
PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) (1993). Informe sobre el desarrollo humano 1993. Nova York, ONU.
SACHS, Ignacy (1984). The strategies of ecodevelopment. Ceres. FAO Review of Agric. Develop., 17, pp. 17-21.

Desenvolvimento e Natureza: Estudos para uma sociedade sustentável

A Economia da Sustentabilidade Princípios:
O Problema do Desenvolvimento Sustentável:
Franz Josef Brüseke

Desenvolvimento sustentável, sustainable development ou nachhaltige Entwicklung é um conceito aparentemente indispensável nas discussões sobre a política do desenvolvimento no final deste século. Estações importantes da discussão sobre um conceito alternativo de desenvolvimento foram:
  • A Contribuição do Clube de Roma: 
  • A Tese dos Limites do Crescimento
No ano de 1972 Dennis L. Meadows e um grupo de pesquisadores publicaram o estudo Limites do crescimento. No mesmo ano aconteceu a conferência de Estocolmo sobre ambiente humano. Nem a publicação do Clube de Roma, nem a conferência de Estocolmo caíram do céu. 
  • Elas foram a conseqüência de debates sobre os riscos da degradação do meio ambiente que, de forma esparsa, começaram nos anos 60, e ganharam no final dessa década e no início dos anos 70 uma certa densidade, que possibilitou a primeira grande discussão internacional culminando na Conferência de Estocolmo em 1972. 
O estudo do Clube de Roma reconhece a importância dos trabalhos anteriores e escreve: As conclusões que seguem emergiram do trabalho que empreendemos até agora. Não somos, de forma alguma, o primeiro grupo a formulá-las. Nestes últimos decênios, pessoas que olharam para o mundo com uma perspectiva global e a longo prazo, chegaram a conclusões semelhantes (Meadows, 1972:19). As teses e conclusões básicas do grupo de pesquisadores coordenado por Dennis Meadows (1972:20) são:
  1. Se as atuais tendências de crescimento da população mundial industrialização, poluição, produção de alimentos e diminuição de recursos naturais continuarem imutáveis, os limites de crescimento neste planeta serão alcançados algum dia dentro dos próximos cem anos. O resultado mais provável será um declínio súbito e incontrolável, tanto da população quanto da capacidade industrial.
  2. É possível modificar estas tendências de crescimento e formar uma condição de estabilidade ecológica e econômica que se possa manter até um futuro remoto. O estado de equilíbrio global poderá ser planejado de tal modo que as necessidades materiais básicas de cada pessoa na Terra sejam satisfeitas, e que cada pessoa tenha igual oportunidade de realizar seu potencial humano individual.
  3. Se a população do mundo decidir empenhar-se em obter este segundo resultado, em vez de lutar pelo primeiro, quanto mais cedo ela começar a trabalhar para alcançá-lo, maiores serão suas possibilidades de êxito. Para alcançar a estabilidade econômica e ecológica, Meadows et al. propõem o congelamento do crescimento da população global e do capital industrial; mostram a realidade dos recursos limitados e rediscutem a velha tese de Malthus do perigo do crescimento desenfreado da população mundial. A tese do crescimento zero, necessário, significava um ataque direto à filosofia do crescimento contínuo da sociedade industrial e uma crítica indireta a todas as teorias do desenvolvimento industrial que se basearam nela. As respostas críticas às teses de Meadows et al. surgiram conseqüentemente entre os teóricos que se identificaram com as teorias do crescimento. O prêmio Nobel em Economia,
Solow, criticou com veemência os prognósticos catastróficos do Clube de Roma (Solow, 1973 e 1974). Também intelectuais dos países do sul manifestaram-se de forma crítica. Assim Mahbub ul Haq (1976) levantou a tese de que as sociedades ocidentais, depois de um século de crescimento industrial acelerado, fecharam este caminho de desenvolvimento para os países pobres, justificando essa prática com uma retórica ecologista. Essa foi uma argumentação freqüentemente formulada na UNCED no Rio, em 1992, mostrando a continuidade de divergências e desentendimentos no discurso global sobre a questão ambiental e o desequilíbrio sócio-econômico.

Uma Nova Proposta: Ecodesenvolvimento:
  • Foi o canadense Maurice Strong que usou em 1973 pela primeira vez o conceito de ecodesenvolvimento para caracterizar uma concepção alternativa de política do desenvolvimento. Ignacy Sachs formulou os princípios básicos desta nova visão do desenvolvimento. 
Ela integrou basicamente seis aspectos, que deveriam guiar os caminhos do desenvolvimento: 
a) a satisfação das necessidades básicas;
b) a solidariedade com as gerações futuras; c) a participação da população envolvida;
d) a preservação dos recursos naturais e do meio ambiente em geral;
e) a elaboração de um sistema social garantindo emprego, segurança social e respeito a outras culturas, e
f) programas de educação. As idéias do ecodesenvolvimento não podem negar a sua relação com a teoria do self-reliance, defendida nas décadas anteriores por Mahatma Gandhi ou Julius Nyerere. 
Ul Haq (1973) e Dieter Senghaas (1977) radicalizaram a argumentação, defendendo a necessidade da dissociação entre os países centrais e os países periféricos, para garantir o desenvolvimento dos últimos. A teoria do ecodesenvolvimento referiu-se inicialmente às regiões rurais da África, Ásia e América Latina; ela ganhou cada vez mais uma visão das inter-relações globais entre subdesenvolvimento e superdesenvolvimento. 
  • Uma crítica da sociedade industrial e conseqüentemente uma crítica da modernização industrial como método do desenvolvimento das regiões periféricas viraram parte integrante da concepção do ecodesenvolvimento.
Podemos constatar, principalmente nos trabalhos de Ignacy Sachs, mas também de Glaeser & Uyasulu (1984), que os debates sobre o ecodesenvolvimento prepararam a adoção posterior do desenvolvimento sustentável. Sachs usa hoje frequentemente os conceitos ecodesenvolvimento e desenvolvimento sustentável como sinônimos.

A Declaração de Cocoyok:

A Declaração de Cocoyok é resultado de uma reunião da UNCTAD (Conferências das Nações Unidas sobre Comércio-Desenvolvimento) e do UNEP (Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas) em 1974. Ela contribui para a discussão sobre desenvolvimento e meio ambiente, destacando as seguintes hipóteses: 
  • A explosão populacional tem como uma das suas causas a falta de recursos de qualquer tipo; pobreza gera o desequilíbrio demográfico; 
  • A destruição ambiental na África, Ásia e América Latina é também o resultado da pobreza que leva a população carente à superutilização do solo e dos recursos vegetais; 
  • Os países industrializados contribuem para os problemas do subdesenvolvimento por causa do seu nível exagerado de consumo. 
Não existe somente um mínimo de recursos necessários para o bem-estar do indivíduo; existe também um máximo. Os países industrializados têm que baixar seu consumo e sua participação desproporcional na poluição da biosfera.

O Relatório Dag-Hammarskjöld (1975):
  • As posições de Cocoyok foram aprofundadas no relatório final de um projeto da Fundação Dag-Hammarskjöld com participação de pesquisadores e políticos de 48 países. O UNEP e mais treze organizações da ONU contribuíram. Este relatório aponta, e ultrapassa outros documentos até então, para a problemática do abuso de poder e sua interligação com a degradação ecológica. 
Assim, ele mostra que o sistema colonial concentrou os solos mais aptos para a agricultura na mão de uma minoria social e dos colonizadores europeus. Grandes massas da população original foram expulsas e marginalizadas, sendo forçadas a usar solos menos apropriados. Isso levou na África do Sul, no Marrocos e em inúmeros outros lugares à devastação de paisagens inteiras. O Relatório Dag-Hammarskjöld divide com a Declaração de Cocoyok o otimismo que se baseia na confiança de um desenvolvimento a partir da mobilização das próprias forças (self-reliance). 
  • O radicalismo dos dois documentos expressa-se na exigência de mudanças nas estruturas de propriedade no campo, esboçando o controle dos produtores sobre os meios de produção. Os dois relatórios dividem também o fato da sua rejeição ou omissão pelos governos dos países industrializados e dos cientistas e políticos conservadores. 
O fracasso de várias experiências com modelos de desenvolvimento à base da self-reliance, como na Tanzânia ou, de forma dramática, no Camboja e a crescente relativização da experiência chinesa fortaleceram ainda mais esta reação.

Sustentabilidade como Estratégia de Desenvolvimento: 
O Relatório Brundtland:
  • Desenvolvimento sustentável é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades. O Relatório Brundtland é o resultado do trabalho da Comissão Mundial (da ONU) sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (UNCED). Os presidentes desta comissão eram Gro. Harlem Brundtland e Mansour Khalid, daí o nome do relatório final. O relatório parte de uma visão complexa das causas dos problemas sócio-econômicos e ecológicos da sociedade global. 
Ele sublinha a interligação entre economia, tecnologia, sociedade e política e chama também atenção para uma nova postura ética, caracterizada pela responsabilidade tanto entre as gerações quanto entre os membros contemporâneos da sociedade atual. O relatório apresenta uma lista de medidas a serem tomadas no nível do Estado nacional.  Entre elas: 
  • Limitação do crescimento populacional; 
  • Garantia da alimentação a longo prazo; 
  • Preservação da biodiversidade e dos ecossistemas; 
  • Diminuição do consumo de energia e desenvolvimento de tecnologias que admitem o uso de fontes energéticas renováveis; 
  • Aumento da produção industrial nos países não industrializados à base de tecnologias ecologicamente adaptadas; 
  • Controle da urbanização selvagem e integração entre campo e cidades menores; 
  • As necessidades básicas devem ser satisfeitas.  O Relatório Brundtland define também metas a serem realizadas no nível internacional, tendo como agentes as diversas instituições internacionais. Aí ele coloca: 
  • As organizações do desenvolvimento devem adotar a estratégia do desenvolvimento sustentável; 
  • A comunidade internacional deve proteger os ecossistemas supranacionais como a
  • Antártica, os oceanos, o espaço; 
  • Guerras devem ser banidas; 
  • A ONU deve implantar um programa de desenvolvimento sustentável.
Em comparação com as discussões nos anos 70 (Declaração de Cocoyok, Relatório Dag-Hammarskjöld) mostra o relatório da comissão Brundtlandt um grau elevado de realismo. Ele nem propaga a dissociação ou a estratégia da self reliance nem a despedida do crescimento econômico. Interesses ele toca com cuidado e mantém sempre um tom diplomático, provavelmente uma das causas da sua grande aceitação depois de ser publicado. 
  • Todavia, a crítica à sociedade industrial e aos países industrializados tem em comparação com os documentos internacionais anteriores (Cocoyok, Dag-Hammarskjöld) um espaço bastante diminuído. O Relatório Brundtland define ou pelo menos descreve o nível do consumo mínimo partindo das necessidades básicas, mas é omisso na discussão detalhada do nível máximo de consumo (e de uso de energia etc.) nos países industrializados. O Relatório Brundtland quer crescimento tanto nos países não industrializados quanto nos países industrializados. 
Além do mais, ele torna a superação do subdesenvolvimento no hemisfério sul dependente do crescimento contínuo nos países industrializados. Como esta posição casa com a crítica do desenvolvimento do ponto de vista ecológico fica mais do que duvidoso.

A UNCED no Rio em 1992:
  • Em junho de 1992 reuniram-se no Rio mais de 35 mil pessoas, entre elas 106 chefes de governos, para participar da conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED). 
O Relatório do Worldwatch Institute de 1993, critica os resultados dessa conferência: Apesar do interesse mundial mais intensivo pelo futuro do planeta, a conferência da ONU não correspondeu nem às esperanças e nem às expectativas com ela ligadas. Muitos problemas surgiram em conseqüência da pressão da delegação dos Estados Unidos em favor da eliminação das metas e dos cronogramas para a limitação da emissão de CO2 do acordo sobre o clima; assim este foi degradado para uma declaração de boas intenções. 
  • Também a convenção sobre a proteção da biodiversidade teve alguns pontos fracos; o mais grave foi a falta da assinatura dos Estados Unidos. Apesar dessas restrições, documentou a UNCED o crescimento da consciência sobre os perigos que o modelo atual de desenvolvimento econômico significa. 
A interligação entre o desenvolvimento sócio-econômico e as transformações no meio ambiente, durante décadas ignorada, entrou no discurso oficial da maioria dos governos do mundo.

Rumo a uma Nova Teoria do Desenvolvimento?
  • O conceito de desenvolvimento sustentável tem uma conotação extremamente positiva. Tanto o Banco Mundial, quanto a UNESCO e outras entidades internacionais adotaram-no para marcar uma nova filosofia do desenvolvimento que combina eficiência econômica com justiça social e prudência ecológica. 
Esse tripé virou fórmula mágica, que não falta em nenhuma solicitação de verbas para projetos da natureza mais variada no campo eco-sócio-econômico dos países e regiões do nosso velho Terceiro Mundo. 
  • O conceito desenvolvimento sustentável sinaliza uma alternativa às teorias e aos modelos tradicionais do desenvolvimento, desgastadas numa série infinita de frustrações. E não eram poucas as teorias que queriam esclarecer as causas do subdesenvolvimento. 
Lembramo-nos rapidamente: 
a) da teoria do subconsumo (Luxemburgo);
b) da teoria do exército industrial de reserva (Sternberg);
c) da teoria dos monopólios mundiais (Lênin); das contribuições subsequentes de Baran, Bettelheim, Amin, Palloix, Sweezy;
d) da teoria da dependência, representada de um lado por Sunkel, Furtado, Jaguaribe etc. e, por outro, por Frank, dos Santos, Córdova,
Cardoso, Ianni etc.; lembremo-nos que nesse contexto desenvolveu-se a discussão da teoria do capitalismo periférico (Senghaas) e da heterogeneidade estrutural. Não vamos ignorar também:
e) a teoria da causação circular cumulativa (Myrdal);
f)a teoria da modernização, respectivamente, do desenvolvimentismo (Hirschman, Prebish, Knakal, Pinto etc.);
g) a teoria do câmbio desigual (Amin, Emmanuel, Mandel etc.) e, finalmente,
h) a teoria do mercado mundial capitalista (Bosch, Schöller).
O julgamento sobre uma teoria do desenvolvimento depende essencialmente das expectativas com que ligamos teorias e sua aplicação empírica. Isto é o ponto de partida que já pode separar os ânimos. 
Nós esperamos e isso separa-nos de forma clara do pessimismo macro teórico, que se confronta da mesma maneira com a crítica de ser modista como as tentativas recentes de uma reformulação de uma teoria do desenvolvimento global, apesar da perda de plausibilidade das grandes teorias sociais, o seguinte: uma teoria do desenvolvimento tem que: 
a) contribuir para a interpretação sistemática do desenvolvimento social;
b) tem que demonstrar seu valor heurístico nos estudos de casos;
c) deve na base da sua coerência interna servir para orientar a ação social com sentido numa situação que seria menos transparente sem a existência dessa teoria.
Não pode ser o objetivo tentar provar a praticabilidade de uma perspectiva teórica no exemplo da Amazônia ou dos Trópicos Úmidos em geral. Também não pode ser o nosso objetivo defender uma teoria para a qual Brasil ou Amazônia possui meramente o papel de objeto de demonstração. É simplesmente impossível desenvolver longe das realidades uma teoria que esperasse somente a sua prova. E isto porque a verificação de uma teoria é impossível
  • Mas ela tem que ser construída de maneira que admita a sua falseabilidade. Para examinar-se uma teoria, ela tem que se confrontar com o procedimento de falsificação se ela sobrevive a este procedimento, e desdobra além disso força heurística, mantemos a teoria. De nenhuma maneira podemos escapar do problema da dedução como não podemos evitar a necessidade de uma hipótese inicial ou pelo menos de uma idéia brilhante. 
Entre a determinação dos princípios máximos através da escolha, da análise da ciência ou de uma simples afirmação, não existe em relação à função do sistema teórico ideal nenhuma diferença. Sem dúvida, o cientista confronta com fatos emergentes suas teses mais ou menos gerais na forma de hipóteses (Horkheimer, 1968:141).
  • Quem acompanha as tentativas de interpretar os acontecimentos regionais na Amazônia à base de teorias complexas, confronta-se com a inadequação aparente entre o esforço conceitual e a essência empírica da análise. Tanto Bunker (1985), como Altvater (1987) e Costa (1989), para mencionar os trabalhos que são no nosso contexto mais importantes, experimentam nas suas argumentações com reflexões altamente teóricas, que, muitas vezes, e sem prejudicar o valor do trabalho, contrastam com as passagens empíricas.
O contraste entre teoria e empiria nos trabalhos mais recentes sobre a Amazônia não vem por acaso; ele é a expressão do movimento de procura de explicações que as teorias conhecidas não mais fornecem. Qual é a contribuição da teoria de dependência para o entendimento da destruição da floresta tropical? 
  • Este problema, junto com a desestruturação sócio-econômica, são, nessa grandeza, problemas novos e integrados em estruturas dinâmicas com uma complexidade crescente, que as teorias conhecidas não mais alcançam. Elas somente aparentam ser teorias mais perto da realidade porque já entraram no panteão das teorias científicas. 
Os teóricos da dependência do Brasil calaram-se há mais de uma década sobre a crise estrutural que está ameaçando quebrar a espinha dorsal da sociedade brasileira. Menzel e outros discutem há anos abertamente sobre as lacunas das teorias do desenvolvimento dos anos 60 e 70. 
  • Propostas desenvolvidas no contexto da teoria da dependência, como o conceito da dissociação, combinaram, numa certa fase histórica, mais com os interesses nacionais da fase pós-colonial depois da Segunda Guerra Mundial do que contribuíram para a análise do desenvolvimento real. São lacunas que se manifestaram com mais nitidez ainda depois do colapso do socialismo à la União Soviética e o fim da confrontação militar entre as superpotências. Falar sobre imperfeições das teorias do desenvolvimento inclui obviamente a integração de elementos teóricos bem-sucedidos. 
A crise do endividamento, por exemplo, significa, sim, a transferência de capital para as metrópoles. Teorias de acumulação e teorias sobre os desequilíbrios da economia mundial têm a sua função, devem ser mantidas e ampliadas.
  • Nas circunstâncias atuais, marcadas pela tentativa secular e pelo fracasso da industrialização não-capitalista, o desdobramento de uma polêmica apontando deficiências parece mais fácil do que a reconstrução de alternativas teóricas e práticas do desenvolvimento. 
Governos e candidatos ao governo abraçam ainda com a coragem dos desorientados a idéia da modernização, sem perceber que o modelo da industrialização tardia é capaz de modernizar alguns centros ou setores da economia, mas incapaz de oferecer um modelo de desenvolvimento equilibrado da sociedade inteira. A modernização, não acompanhada da intervenção do Estado racional e das correções partindo da sociedade civil, desestrutura a composição social, a economia territorial, e seu contexto ecológico.
  • Por isso, necessitamos de uma perspectiva multidimensional, que envolva economia, ecologia e política ao mesmo tempo. Isso, no fundo, é o ponto de partida da teoria do desenvolvimento sustentável. Apesar da sua estrutura ainda inacabada, aponta este conceito na direção certa. Quem não quiser se perder no caminho, precisa mais do que boa vontade, ou financiamento externo: precisa de ciência. 
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Desenvolvimento e Natureza: Estudos para uma sociedade sustentável